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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

ANÁLISE: UFC on FOX 2 - Evans VS Davis


O primeiro UFC na FOX teve Cigano se sagrando campeão e o espancamento de Guida pelas mãos cheias de fé de Ben Henderson, mas foi um evento não previsto no contrato entre emissora e Zuffa. Quase um bônus. Foi tentativa de aproveitar o fim de ano para calibrar transmissão que costumeiramente se desenvolvia no espaço elástico do pay per view. Agora necessitava de sincronia perfeita entre FOX, FX e Facebook. Tempo de lutas, nova vinheta, tudo tinha que se encaixar justo e tomar formato de programa de ponta em uma das maiores emissoras dos EUA. Contratualmente esse UFC foi o primeiro evento programado, com 3 lutas no card principal transmitidos pela FOX. E se tudo foi perfeito no ensaio ano passado, agora as coisas não se desenrolaram de maneira tão suave num exemplo prático da sabedoria de botequim de que “treino é treino e jogo é jogo”. Não adianta luz, câmera, sem ação. Efeitos especiais, divulgação, belas ring girls, bravatas na coletiva de imprensa ou o melhor announcer do mundo, nada é mais importante do que acontece dentro das 8 grades. Lá MMA surgiu e é lá dentro que pode morrer. A questão lúdica que povoa nossa cabeça desde criança de saber quem é o melhor lutador do mundo nos mantém acordado tantas madrugadas, esperando atletas que dedicam sua carreira ao combate nos darem resposta com violência, coragem e talento. Muito pouco disso vimos nesse UFC on FOX 2, que mesmo assim teve facilmente mais pontos de audiência do que qualquer outro programa no horário entre homens de 18 a 49 anos. A questão é quantos desses ao assistir MMA pela primeira vez na forma de 11 rounds melancólicos em 3 lutas do card principal, repetirão a dose. Muito do que Cigano construiu com uma mãozada ano passado, Evans, Davis, Sonnen, Bisping, Maia e Weidman destruíram sem a menor vergonha.

Charles do Bronx’s VS Eric Wisely

Geralmente começo a análise pela luta principal, mas me sinto pressionado pelo bom senso a abrir uma exceção. Num evento estéril, com gente ganhado milhões para falar besteiras nas entrevistas e lutar pouco, é emocionante ver um atleta genuinamente talentoso, ainda puro em sua intenção ininterrupta de vencer. Sem falar dos outros, sem pensar demais, sem hesitar. Charles Oliveira vinha de três lutas sem vitória. Derrotas pelas mãos de dois dos melhores do mundo e um no contest, por conta de joelhada ilegal em Nik Lentz. Quase qualquer lutador vivo entraria nesse quarto combate com o pé acorrentado a pedra da precaução. Daria dois passos pra trás e um pra frente. Mais jabs que uppers ou diretos. Controlaria mais no chinch do que tentaria derrubar, e se derrubasse, passaria a guarda e daria uns cascudos ao invés de ir para finalizar. Do Bronx’s não fez nada disso. Na verdade nunca faz nada do que achamos que vai fazer por isso é imprescindível para o esporte. Perdendo ou ganhando luta com alma. Como um coração enorme consegue bater espremido dentro de uma caixa torácica tão achatada, deixo para as máquinas de raios-X entenderem. Fato é que parece lutar por muitos e outros como se não lutassem por nada. Quer demais enquanto para outros, tanto faz. Entrou, atacou, viu uma panturrilha e finalizou. Simples assim. Se pega pé no rola, vai ver um na hora decisiva e deixar passar por quê? De que adianta nocautear os companheiros de treino e não dar soco com medo de perder a montada na luta, como tantos fazem? Bronx’s luta da maneira que pratica, que vive. Ele existe assim, em uma forma só, sem máscara, sem dúvidas. Enquanto tantos nesse card lutaram querendo ganhar, ele lutou para ganhar.

Eric Wisely é um lutador mediano. Não podemos afirmar que Charles venceu alguém relevante, mas os grandes fazem assim. O Barcelona joga bem mesmo contra adversários ruins. Os melhores fazem o incrível sempre, não se escoram na incompetência do adversário para justificar mediocridade, brilham mesmo sobre o apagado, bailam sozinho, cantam a capela.

Pequeno no peso leve ficou gigante no pena. Alto, longo e ocupando menos espaço que antes vai prensar ali dentro toda tática, genialidade, força, velocidade e foco que já faziam dele um dos mais promissores. Vai comprimir nêutrons e prótons, vai explodir na cara do adversário. Móvel, versátil, ataca de todos os lados pra pegar ou machucar. Vai ser líquido enquanto os comuns são sólidos. Num peso onde podia ser jogado de um lado para o outro como um boneco de pano, só foi perder para dois TOP 10. Tomou a melhor decisão de sua vida ao descer de peso e se tornar a única real ameaça a José Aldo. Charles do Bronx’s é pessoa simples, direta, sem frases de efeito, ameaças e coisas que ajudem a promover a luta. É um menino quase sem graça até. Mas dentro do octagon seus passos deixam traços de pó pirlimpimpim.

Rashad Evans VS Phil Davis

Evans e Davis se enfrentaram para decidir o próximo a desfrutar do direito masoquista de ser desmantelado por Jon Jones. Antes da luta, tinha certeza que nenhum dos dois, apesar de extremamente talentosos e bem preparados, carregava chance real contra o campeão, mas depois de 5 rounds sem força ou ímpeto vencedor, a certeza é de que qualquer um deles será humilhado.

Phil Davis venceu com facilidade Minotouro e Gustafsson, que se enfrentarão no UFC Suécia, mas nem assustou Rashad Evans. Cansou rápido apesar de ser um atleta de ponta e adepto de um dos mais exigentes regimes de treinamento. Com preparo físico estelar, parecia drenado ao final do primeiro round. Sem resistência cardiovascular. Laranja sem suco é só bagaço. Parecia exaurido pela importância da luta, da transmissão em emissora aberta, coisas fora da parte física. Porque a luta em si, apesar de várias esgrimas cansativas de wrestling, não exigiu de nenhum dos dois mais do que poderiam facilmente oferecer. Parece que amarelaram sincronizadamente e estrelaram um dos mais deprimentes eventos principais de todos os tempos. Ah! Que saudade de Munhoz Vs Leben.

Evans vem lutando pouco nos últimos anos, seja por lesões suas, seja por ter optado esperar determinados adversários se recuperarem de suas próprias lesões. Fato que seu corpo e preparação nunca mantém a mesma qualidade por dois combates seguidos. Pode estar com gás infinito contra Jackson ou esbaforido na metade do segundo round contra Davis. Muito tempo parado, muitos recomeços, o corpo sente de alguma forma. Lutou uma vez em 2009, duas em 2010 e uma em 2011. Apenas quatro lutas em três anos. O veterano e teoricamente aposentado Matt Hugues vem lutando com mais freqüência.

Rashad é um atleta incrível. Um dos maiores do mundo com facilidade. Poderia descer para o peso médio onde seria assustador, mas alguma coisa no somatório de suas habilidades não encaixa. Tem tudo, mas falta alguma coisa. Bom de boxe, mão pesada, incrível em quedas e defesa de quedas, eficaz em jiu-jitsu, poderoso ground and Pound, mas simplesmente não consegue mais ser contundente. Não consegue mais ferir a maioria dos adversários. Pegou tudo que poderia fazer dele um nocauteador nato, um dos mais amados e admirados, juntou numa gororoba de quedas e controle, sem emoção ou contundência. O Rashad antigo, aquele que nunca se imaginou campeão de alguma coisa, que ouvia que não era bom o suficiente, esse sim, dava o queixo, caia dentro, nocauteava, quebrava e vencia. Depois que cismou que só vale a pena ser campeão, acreditando piamente que o segundo é o primeiro dos últimos, aprendeu a manter a distância, transformar cada round em um campeonato de wrestling e cada momento no solo numa competição sem pano.

Evans é um dos mistérios do MMA. Comentarista convidado da ESPN live, campeão do TUF e do meio pesado, é vaiado até contra lutadores de outras nacionalidades, como foi o caso de quando defendeu seu cinturão contra Lyoto. O próprio declarou que recebe muito carinho dos fãs fora das lutas, mas no octagon e em pesagens, não importa contra quem, vença ou perca, as vaias virão. E tendo esse som como trilha sonora de sua vida, deu motivo até para seu fã mais ardoroso dar uma vaiadinha nesse UFC on FOX 2. Comedido, econômico, abusou do excesso de experiência, timing e controle de octagon e venceu sem sustos para ele ou emoção para nós. Disse ter dificuldade em se concentrar nessa, quando é apenas a luta pelo cinturão que tem na cabeça. Caiu no bueiro andando em direção ao restaurante. Venceu tranquilamente um dos atletas mais naturalmente explosivos, condecorados e muscularmente preparados do esporte, mas fez tão sem garra que pareceu irrelevante. Daqui a dois anos é que teremos real medida da qualidade de Phil Davis. O ponto a ressaltar é que Evans desperdiçou a chance de meter o pé na porta do saloon antes de atirar no xerife. Era o momento de acertar um mata cobra emocional em seu desafeto, Jon Jones. Mostrar que está em Kill Bill mode, com os nervos pinçados pela vingança, fazer o imbatível adversário tremer frente a sua raça e sentimento, qualidades que costumeiramente encontram brechas na armadura do talento. Colocar na confiança inabalável do campeão alguns farelos de receio. Nada disso Rashad fez. Verdade que em MMA tudo pode acontecer, mas essa improbabilidade não tem permissão para adentrar o reino de Jones. Lá, ele sempre vencerá. Rashad já perdeu.

Chael Sonnen VS Michael Bisping

Dana White afirmou que Sonnen e Bisping são os dois lutadores mais odiados do planeta. Na verdade são os dois mais farofeiros, ou como diziam na época da vovó: “fala - baratos”. Perceberam rapidamente o fascínio que palavras malditas, ofensas e falsas rivalidades geram sobre o atleta. Criando uma aura de interesse que vai além da habilidade, levando fãs a acompanhá-lo como um BBB ambulante, atrás de novas declarações e torcer para vê-lo apanhar e ser punido por tais injúrias. Nada exclusiva dos dois, essa tática funciona para qualquer lutador, de marmelada na saudosa época de Teddy Boy Marino até o morto-vivo K-1. Todos querem ver o que vai fazer aquele que falou demais. Isso vale para vender pay per view, aumentar o número de retweets, divulgar a luta, mas na hora que o portão fecha o que conta é performance. E eles que vinham de bons momentos, resolveram fazer tudo diferente no UFC on FOX 2. Quando os holofotes foram acesos, correram para a sombra. Seguraram golpe quando era para nocautear, socaram sem força quando era para machucar. Venceu um, mas poderia ter sido o outro. Uma luta equivalente e desprezível.

Bisping lutou bem. Talvez melhor do que lutou sua vida inteira, mas sua quantidade de talento é diminuta demais para fazer frente a um atleta de real alto nível. Não tem contundência, não tem pressão, mas teve vontade e coragem. Muito mais do que seu adversário que tanto falou. Bisping teve sua melhor apresentação no UFC e Sonnen uma das piores, mas isso foi suficiente apenas para manter o equilíbrio em uma luta que já parecia decidida. De tanto falar qualquer coisa e perceber que as pessoas acreditam, Sonnen resolveu acreditar nas pessoas e encarou Bisping como se fosse luta fácil. Partiu para cima para derrubar, despedaçar e não conseguiu. Se levarmos em conta que Bisping vinha se preparando para um lutador de jiu-jitsu que jamais tentaria derrubá-lo, foi desmoralizante Sonnen ter quase todas suas investidas neutralizadas. Venceu claramente o terceiro round, mas os dois primeiros poderia ter vencedor decidido no par ou ímpar. Nenhum tentou um pouco mais, nenhum realmente se expôs. Um venceu e vai fazer sua dita sonhada revanche contra Anderson, outro perdeu e continuará sendo divulgado como estrela do MMA por ser o maior representante da Inglaterra.

Se Sonnen conseguiu ser descabelado pelos socos de mão de bicho de pelúcia de Bisping, não agüenta um jab/direto de Anderson Silva. Acho que ao derrubar o adversário pela primeira vez e ver a chance de descer a mão, quebrar o atleta inferior, coisa que apesar de ser especialista mal fez nessa luta, sentiu uma pontadinha lá no fundo de sua consciência. Tal qual o rasgo de uma mini estrela ninja. Uma gotícula de razão no mar de provocações e impropérios que vem proferindo faz anos. Se deu conta que um soco bem dado no inglês poderia ser nocaute e carimbo de sua passagem para o Brasil, onde teria que compensar o cheque que sua boca passou mesmo sabendo não ter fundos. Talvez tenha passado a luta inteira numa espécie de: “ai meu deus, e se eu ganhar?” que tirou sua conhecida agressividade e força nos punhos. Tentou derrubar sem vontade, e não conseguiu, bateu sem pressão e não machucou. Se tivesse pênalti, pedia pra não chutar. Sonnen amarelou para Anderson antes mesmo do contrato ser assinado. Seu sonho real não era uma revanche. Era perder essa luta, dizer que o resultado foi controverso e passar mais um ano falando besteira e ganhando milhões com patrocinadores. Anderson Vs Sonnen é luta que todos os habitantes do planeta Terra que já ouviram falar de MMA realmente queriam que acontecesse, com exceção de uma única pessoa: Chael Sonnen. E como sou afeito a sabedoria popular, deixo aqui transcrita a frase que vai lembrar até o fim de seus dias: “Uh! Vai morrer!”.

Demian Maia VS Chris Weidman

Um lutador que podia ser incrível, mas optou por ser mediano, e um dos mais promissores jovens da atualidade com apenas 11 dias para se preparar, protagonizaram uma luta arrastada durante três particularmente longos rounds. Seja porque o veterano via nessa a última oportunidade de se aproximar do cinturão, seja pelo mais novo não ter o que perder, os dois tinham o compromisso ético de fazer desse um combate movimentado. MMA que tantas vezes no surpreende, dessa vez nos pregou uma peça.

Luta a luta Maia incorpora alguma coisa diferente ao seu jogo, mas não evolui, apenas muda. De fantástico e temido no solo, a lutador que faz de tudo para se manter em pé e boxear sem jabs ou precisão. Quem o convenceu a trocar chão perfeito por socos de baixa qualidade, não é apenas um mal mentor, é pessoa com lábia para ter uma seita religiosa. Demian se lança em trocações como se pagasse alguma promessa. O que seria excelente arma para atrair até a emboscada, amaciar o oponente e abatê-lo sem piedade no solo, virou uma lente difusa. Maia que nos mostrou ter perdido o ajuste em posições básicas de jiu-jitsu na luta contra Munoz, agora dá sinais de que nem mais ali que estar, se esmerando para voltar de pé assim que se vê na horizontal. Vive amor platônico pela nobre arte e está sendo incinerado pelo sentimento. Vai ser queimado por essa paixão bandida que já fez tantas vitimas: Minotauro, Couture, Sakuraba, Hughes e outros mestres em misturar, que se encantaram pela separação. Agarraram uma arte e esnobaram as outras. Ingratos. Foi o começo de tantos fins e seu não é diferente. Parece o português que se mudou para a Alemanha, não aprendeu alemão, esqueceu o português e acabou mudo.

Weidman é melhor do que vimos. Sua trocação estava mole e sem ajuste, coisa de que quem vem apenas treinando para manter a forma, sem sintonia fina ou estratégia traçada. Apesar de que ouvir Dórea ordenar Maia, entre rounds, a derrubar o adversário all american, me leva a crer que eles também não tinham nenhuma. Mesmo assim, se arrastando, sem tática e sem preparo físico, foi melhor em todos os rounds. Pareceu estar lutando mal, mas fez demais dentro das condições em que se encontrava. Weidman precisa de uns dois anos para elevar seu potencial a TOP 10 da categoria, e quando chegar lá vai ficar um bom tempo.

Se Demian não mostra mais um jiu-jitsu refinado nem boxe eficaz, em uma coisa ele vem se tornando especialista: fazer lutas chatas. Perdeu metade das últimas seis lutas, e todas foram para a decisão. As últimas terminadas antes do tempo regulamentar foram a finalização de Sonnen e o nocaute pelas mãos de Marquardt, em 2009. Maia tem chances de ser cortado apenas por não ser mais um lutador empolgante dentro ou fora do octagon. Muitos foram por menos que isso. Júnior Assunção foi cortado do UFC sempre indo para frente e com apenas uma derrota nas últimas seis lutas. Tudo pode acontecer, mas gostaria que Dana White esperasse uma luta entre ele e Toquinho aqui no Brasil, para tomar essa decisão. Só não coloque no card principal, porque maluquinho como Toquinho é, e chato como Maia está, a luta pode não ser nada do que estamos esperando.

4 comentários:

  1. Brother bom dia. Gosto muito de seus comentários, e esse do ultimo ufc foi genial!!! Exato!!!
    Todos esses comentaristas que estão na tv ficam com medo de falar a verdade, e vc sempre cutuca a ferida com sábias palavras. Espero que os lutadores, treinadores e até mesmo os organizadores do evento, leiam suas palavras e as levem como uma critica estupidamente construtiva. Um abraço.

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  2. Os lutadores não costumam ler meus textos, por enquanto. Gostaria que Anderson, Wanderlei, Aldo e Cigano tivessem lido o que escrevi sobre eles. Mas acho que não leram. Infelizmente.

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