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sábado, 24 de dezembro de 2011

ANÁLISE: UFC 140 - Jones VS Machida


O UFC 140 foi um evento cafajeste. Sem vergonha nos entregou lutas inegavelmente tão emocionantes quanto tristes, excelentes e doloridas. Beijou na boca e bateu na cara. Levou fãs mais experientes a níveis quase insuportáveis de amor por MMA acima de bandeiras ou ídolos, e ensinou de modo rude aos mais novos que esse esporte é assim mesmo. É isso aí. Ou aprendemos a amar o combate, a performance, a surpresa, ou da mesma maneira que serão tantos os dias de alegria e olhos umedecidos de satisfação, tantos mais serão os devastadores com lágrimas se atirando para fora do globo ocular. Esse UFC é um termômetro da nossa paixão pelo esporte ou por lutadores em específico. Nos força a responder se cada dia que sentamos para assistir a um evento, é pelo que tanto dizemos que gostamos, se somos átomos dessa energia que só fluoresce, ou apenas torcemos para pessoas em específico. Um atleta ou outro, acima do todo. Como torcemos para nosso time e ansiamos pela vitória, nem que com pênalti roubado, maquiavelicamente comprometidos com apenas um resultado e mediocremente torcendo a cara para todas as outras glórias. Olhando para o próprio umbigo, num recalque que maltrata toda a beleza. Somos aqueles que estarão de frente para a TV sempre, ou às vezes? Amamos ver o Minotauro vencer mais do que amamos MMA? E quando ele, Wanderlei, Anderson, Belfort, Aldo, Lyoto pararem de lutar. O que irá restar?

Jon Jones VS Lyoto Machida

Lyoto Machida é incrível. Seu cartel de 17 vitórias e 3 derrotas não faz jus ao que vem oferecendo ao MMA nos últimos anos. Tentar, como tantos fazem, diminuir o mérito da eficácia de seu karatê por conta de tantas outras artes que também domina, é como dizer que Wanderlei não teria sido um dos maiores nocauteadores da história sem auxílio do jiu-jitsu. Machida aplica na prática o que parecia só funcionar em vídeos demonstrativos, kata em passagem de faixa ou filmes antigos produzidos em Hong Kong. A velocidade do mundo moderno e um esporte que prima pela mistura de tantas influências atropelaram a eficácia unilateral do karatê. Com a guarda baixa, pulinhos, saídas para os lados, fintas e socos sem pressão a arte milenar parecia fadada a aulas para crianças em escolas do município até que Lyoto apareceu.

Leve, letal, único. Assistir Lyoto lutar é revigorante num esporte cada vez mais tomado por força física, qualidade atlética, tática, quedas e controle. Um homem culto, com a vida estável e família sólida optar por se colocar em risco, em atrito, em constante impacto por paixão a sua arte, é um brinde do acaso para fãs de combates. Cada luta é mais um degrau em sua escada mental rumo ao posto de maior do planeta, quase criança olhando para o pôster de Bruce Lee na parede. Cada luta é um quadro, uma forma de arte, sua alma expressa em movimento. Luta com orgulho no olhar, sentimento de quem faz o que quer, fruta que só os ousados saboreiam.

Lyoto é quase indecifrável porque sua arte marcial não é estudada, não é levada a sério. Adversários analisam o Lyoto, não o karatê. Até porque em mais de 1000 anos ninguém conseguiu fazer o que ele faz. E se fez, não há documentação visual. Tentam entender sem muito sucesso como se move, como é uma coisa parecendo ser outra ou como antecipa pensamentos, porque caminha o terreno mais misterioso possível para a maioria dos homens. Luta por amor. Amor por sentir que toda a vida de ensinamentos de seu pai estão vivos com ele em cada luta, amor de quem não luta sozinho, amor pela sua arte que o leva a lapidar, polir, aperfeiçoar, entender, reinventar, compreender como só faz quem não tem pressa. Quem não pensa só em dinheiro, resultado ou fama. Por amor Lyoto e arte se fundiram numa criatura inigualável, quase imbatível, quase intocável, capaz de fatiar a psique dos adversários com a precisão de uma Hattori Hanzo. Lyoto é um dos melhores, relevantes e importantes atletas do mundo mesmo que não tenha como voltar a ser campeão enquanto Jones existir no meio pesado.

Religiosos falam da segunda vinda ao planeta Terra do filho de Deus. Durante anos achei que pudesse ser Inri Cristo, apesar da comunidade cristã não concordar com a teoria, mas atualmente começo a desconfiar que Jon Jones seja o esperado messias. Não é o melhor wrestler do UFC e derruba sem dificuldade outros tão mais condecorados, sem muito tempo treinando muay thai e jiu-jitsu já foi superior em pé contra Shogun, um dos melhores trocadores do MMA, e finalizou Lyoto Machida, faixa preta da arte suave. Jones parece estar nessa terra numa missão que começa ao se tornar o melhor lutador de todos os tempos, ser amado por todos os povos, abandonar as lutas invicto, caminhar sobre as águas e morrer crucificado.

Dentro do octagon é cristalino em seu olhar o tédio com a certeza do desfecho do combate, mas pela primeira vez em sua carreira perdeu um round. Nem ele foi páreo para Lyoto no auge, em sua zona neutra, em seu limbo onde é inatingível e de onde lança seus golpes como trovões por entre as nuvens. Sem pressão física para nocautear Jones, teria que passar intocado, imaculado, por 5 rounds, e num esporte de contato isso simplesmente não acontece. Lyoto foi genial, um esplendor de brilhantismo e do que faz MMA ser surpreendente durante todos os minutos em que esteve acordado dentro do octagon. Mas quando Jones o segurou, acabou. Espremeu como se fosse um hamster e pronto. Simples assim. Foi posto para dormir de olho aberto, largado no chão como um saco de lixo, sem respeito, com a boca quase beijando os pés do seu algoz num momento messiânico, como se sua alma quisesse ir ao encontro dessa energia tão intensa chamada Jon Jones.

Muitos comentaristas e técnicos de MMA afirmam ter Lyoto encontrado o caminho para vencer Jones por conta do belo primeiro round. Se outro lutador desenvolver alguma técnica de metamorfose e virar Lyoto Machida, pode ser, mas se a solução for reproduzir os movimentos que apenas um lutador no mundo consegue, me parece meio desesperado. É como ver Messi jogando, virar para o time e dizer: “é assim que vocês tem que fazer”. Machida tem o controle de distância que só ele tem e entende. Ninguém luta tão por fora, tão distante, e em fração de segundo atinge e desaparece como ele. Para vencer Jones tem que se ter 99 qualidades, mais sorte, mais técnica de Lyoto, mais queixo do Shogun.

Lyoto sabia o que fazer em pé, mas não tinha a menor idéia de por onde começar quando caiu por baixo, e numa luta desse nível, é fatal. O brasileiro afirma que o corte e impacto lhe prejudicaram nos segundos que antecederam sua derrota, mas antes de ser atingido já estava dominado no chão, com os joelhos fechados e os braços esticados para frente como se defendendo de um estupro, não fazendo uso de alguma técnica ou treinamento específico. Já estava pensando em apenas sobreviver antes do golpe que mudou a luta. Jones o cortou antes mesmo de o atingir. Machida segurou Bones pelos punhos, chamou o vampiro pra dentro de casa, cometeu um erro amador contra um atleta que vai vencer mesmo que o adversário não cometa erro nenhum. Jones se impôs, forçou a barra, não achou brechas então estourou a represa, se despejou gigantesco, escuro, prepotente e imbatível sobre o adversário.

Jones está evolutivamente acima de seus concorrentes, um ser humano em outro nível genético. Quinton e Bader, dois dos atletas mais fortes muscularmente em qualquer peso, são pequenos perto dele, Shogun e Lyoto parecem bonecos de espuma. Aparentemente apenas técnica, ousadia, velocidade, tática e coração não são nem suficientes para incomodá-lo. Até porque também possui essas qualidades. Para ameaçá-lo tem que haver uma mínima equivalência física, o que ninguém no peso possui.

Jon Jones é o Jesus negro, a evolução que o MMA não precisa, o presente que não deveríamos ganhar, a lição de moral que só vamos entender daqui a 10 anos, a lenda prematura, a revolução antes da hora, o vencedor contra qual os derrotados não querem revanche. Vai tirar para pouca coisa, maltratar e dominar grandes lutadores, tantos de nossos ídolos, derrubará todos, vai jogar o tabuleiro de xadrez no chão. Podemos assistir a suas lutas nos maravilhando com algo único e expandir nossa mente antes do fim, ou transformar cada uma de suas performances em exercícios de lamentação e choro pelo derrotado.

OBS 1: Não acho que Jones seja a encarnação de Jesus Cristo. É apenas uma metáfora provocativa.
OBS 2: Se Jones realmente fosse a encarnação de Jesus Cristo, não me surpreenderia.

Frank Mir VS Rodrigo Minotauro

O estilhaçar do braço de Minotauro marcou o fim de uma das lutas mais emocionantes e comoventes do MMA. Saber apreciar a beleza desse combate é colocar o esporte acima de bandeiras, nações ou patriotismo. Amar a forma acima dos componentes. Admitir que mesmo com um brasileiro derrotado no chão, o fã saiu vencedor.

Carismático, pesado, grande, com golpes poderosos, inteligente, bom em defesa de quedas, estratégia, controle de luta e excelente em jiu-jitsu. Frank Mir seria um dos maiores lutadores do mundo se não fosse frouxo. É o cara mais macho e confiante do mundo até levar o primeiro soco na cara, quando desaba moralmente e entrega a luta em troca de misericórdia. Minotauro é voraz, corajoso, não se entrega nunca, foi pra cima, encurralou, bateu até Frank cair de cara no chão e começar a rezar para o juiz terminar o combate. Já estava até com o discurso de revanche ensaiado quando Minotauro resolveu perder. Todos os atletas que atingiram o rosto de Mir no chão venceram o combate. Brock, Carwin, Pé de Pano, Freeman. O único que conseguiu a proeza de não vencer um atleta que queria ser vencido foi o brasileiro. Uma decisão errada, uma posição perdida, lentidão na hora de escapar da chave e pronto. Mir venceu de novo, e dessa vez foi lindo. Teve um dia de Minotauro. Apanhou, caiu, agüentou e finalizou. Nos lamentarmos pela derrota de um é perdermos a chance de nos divertir com a vitória do show.

Mir não fez muito, entrou amuado, de acordo com o próprio sem saber o que fazer para vencer novamente uma lenda tão imponente. Mir é cérebro demais e instinto de menos. Onde muitos lutadores entram no modo automático quando apanham, Mir se apequena. Lógicas, motivos, traumas, tudo isso é entulho quando o objetivo é não ser desfigurado por um atleta profissional de MMA desferindo socos sem defesa. Mesmo assim, não a toa, ainda é um dos maiores do mundo. Quando encaixa uma chave, ninguém sai. Brock Lesnar pulou e arrastou Mir para longe da lona do octagon, mesmo em pleno ar continuou aparafusado na perna. São mil maneiras de vencê-lo e poucas para perder, mas de dentro de uma de suas chaves ninguém consegue escapar. Nem o maior mestre do jiu-jitsu aplicado ao MMA. Mir venceu uma luta emocionante muito mais com gosto de surpresa do que superação. Seu grande ponto fraco continua ali, seu coração de bolinha de gude, que vai impedi-lo de voltar a ser campeão de um UFC povoado por tantos corajosos. Mas sua maior vitória não foi superar o brasileiro, foi quebrar junto com o braço de Minotauro algumas barreiras alfandegárias do nosso coração. Mostrar de modo belo e quase triste que MMA é o maior dos esportes porque se reinventa, toma novas formas. Surpreende. Que grandes histórias e momentos inesquecíveis continuam sendo cunhados, e que os melhores momentos ainda estão por vir para quem se comove com o espetáculo.

Minotauro estava preparado. O mais bem preparado que sua idade e corpo surrado permitem nos dias de hoje. Dizer que está na sua melhor forma de todos os tempos é negar de modo quase inocente seus momentos velozes, onde apanhava sem ser nocauteado, leve e indestrutível no Pride. O Rodrigo de hoje traz mais marcas no corpo do que podemos ver. Ninguém passa pelo que já passou e fica totalmente recuperado. Podemos querer acreditar que sim, mas não é verdade. Sempre há alguma coisa no movimento de pescoço, como o músculo contrai para soltar o soco, na velocidade em que o abdome relaxa e retesa para segurar o impacto centésimos antes de completar a ingestão de ar, em como o maxilar já não parece tão fixo. Chuck, Couture, Tank, Fedor e tantos sabem disso. O corpo do lutador vai esfarelando aos poucos de modo ainda não completamente conhecido pela ciência. Porque um atleta que poderia ser atingido com um taco de baseball e continuar de pé, hoje em dia cai com um cruzadinho mal dado? Não há documentação sobre isso. É um cronômetro biológico, alguma coisa que se sente mais do que explica. E o de Minotauro está quase zerando.

Minotauro não pode mais errar hoje em dia. Seu corpo não agüenta mais pagar esse preço. Errou conta Mir duas vezes e contra Velasquez uma. Perdeu as três. Tem que ser perfeito como foi contra Schaub no UFC Rio e como estava sendo contra Frank até tomar uma das piores decisões de sua vida. O adversário estava de quatro e dominado, entregue como sempre, quando dois socos seus pegam na nuca e o juiz Herb Dean o alertou para tomar cuidado. Mesmo alerta que não foi feito nas lutas de Belfort contra Franklyn e Akyiama que resultaram na vitória do brasileiro. O alerta fez Minotauro parar para pensar, fazer o que Mir sempre faz e lhe custa tantas lutas. Por um segundo colocou o instinto predador de lado, aquele dispositivo que usa a técnica mais adequada ao momento. Trocou reflexo pela razão. Por instinto mudaria o ângulo dos socos e mais 1 ou 2 terminariam o combate. O instinto predador negaria o jiu-jitsu em prol da sobrevivência e destruição do oponente. Mas, racionalmente, uma finalização seria como renascer. A volta de seu jogo de chão que tantos dizem não existir mais, a prova de que Mir poderia até bater nele, como fez da primeira vez, mas no chão nem ele nem ninguém o superaria. Jamais. E por razão, escolha, vontade própria, nada nem passando perto de instinto, abriu mão da vitória certa por um triângulo de mão. De um gol de bico por um de letra. Mir escapou para o braço e o brasileiro, perplexo, não conseguiu posturar ou se defender de um golpe que, antes de encaixado, tem como ser anulado. Parecia se lamentar pela chance perdida mais do que tomar uma providência.

Antonio Rodrigo Nogueira já sabia não dar mais para escapar da finalização e mesmo assim não bateu. Por quê? Só coisas boas me vem a cabeça. Achar que ele foi burro, que já estava perdido o combate então porque não bater, dizer que não há demérito em aceitar a derrota e tantas coisas nessa linha é num por do sol não parar para fitar o horizonte. Minotauro não deixou o braço quebrar para mostrar que é homem, isso ele já mostrou com lágrima e sangue, deixou quebrar porque é disso que ele é feito. Um cabeça dura incrível, como são todos aqueles que fazem alguma coisa relevante nessa vida. Preferia passar pela cirurgia que fosse, e ter parafusos espetados para fora do braço, e mais sessões de fisioterapia e mais a marca eterna na carne da derrota, do que a cicatriz na alma que só ele ia sentir de ter admitido a derrota para alguém tão inferior antes de ter total e inconteste certeza. Minotauro esperou quebrar para dormir com dores, mas em paz. Trocou um braço pela consciência limpa. É direito de alguém que já quebrou tantos outros. E eu que não torço por lutadores em específico, fiquei triste.

As maiores escolhas que um homem faz na vida não costumam ser documentadas em vídeo. A maioria das vezes que choramos, que cortamos na própria carne, que pagamos o preço caro para nos manter sendo quem somos, fazemos sozinhos. Depois respiramos fundo e seguimos em frente. No UFC 140 vimos uma escolha de vida, muito além de bater ou não. Minotauro sempre entregou seu corpo em cada segundo dentro de um ringue ou octagon, sem vergonha de suas limitações, força e fraquezas, nos mostrou ao longo de anos do que é feito. Agora que entregou seu coração, mostrou também quem ele é.

Rogerio Minotouro VS Tito Ortiz

A carreira de Tito Ortiz no maior evento de MMA do mundo só não terminou por conta de sua surpreendente vitória sobre o jovem TOP 10 Ryan Bader. Até essa luta contra Minotouro, tinha sido seu único bom resultado nos últimos 7 combates nos quais esteve envolvido. Uma única vitória em quase 6 anos deu um último fôlego para um atleta que tem a função estratégica de boi de piranha mais caro de todos os tempos. Ortiz só ainda coexiste no mesmo cosmos de outras estrelas do MMA mundial porque com nome, carisma e uma história de glórias na organização, confere qualidade no marketing para o card e vitória quase garantida para algum adversário que queiram presentear com uma melhoria no cartel. Ortiz foi oferendado a Griffin, Bader, Evans e agora Minotouro. Todos atletas a uma ou duas vitórias de poderem entrar na disputa por uma chance de lutar pelo cinturão caso a direção do evento achasse conveniente. Ortiz, sem chances de almejar coisas maiores, aceitou todas no peito e na raça, venceu uma e perdeu as outras. Começa bem, fumegando atitude, mas a casca quebra com um peteleco. Começou melhor, acertou bons socos, mas não agüentou a pressão de um lutador ainda em atividade e bem preparado, se espatifando no chão após uma joelhada e cobrindo o rosto quando o que tinha que proteger era a costela lesionada.

Ninguém dá desculpas melhor que Ortiz. Faz qualquer adversário que o vença parecer que esteve num grande combate e nos dá a impressão de que vai sempre voltar revigorado e melhor. Chegou a afirmar, e alguns acreditaram, que sucumbiu rapidamente aos golpes por serem exatamente no mesmo lugar onde Evans o havia acertado. Quando na verdade o brasileiro o golpeou na área das costelas e o americano, no peito. Resta a Tito mais uma luta, que ele torce para que seja contra Griffin, alguém que ele sabe não ter como humilhá-lo ou nocauteá-lo. Assim tendo um fim de carreira digno, com todos os dentes na boca e mais tempo para agradecer aos fãs e fazer propaganda no fim. O próprio Griffin disse já estar velho para esse esporte e gostaria de fazer lutas contra atletas menos qualificados para não ser nocauteado. Alguém de quem ele agüentasse os golpes para fazer o que faz de melhor. Trocar socos durante três rounds, acabar de pé e abraçar sorrindo o adversário, sem pretensão de cinturão ou almejar coisas maiores. Uma luta entre os dois está desenhada, mas não me parece nem um pouco interessante. Torço para um justo empate e que esses atletas já desinteressados dêem logo espaço para tantos outros sedentos por uma chance.

Minotouro venceu uma luta que tinha que vencer. Não superasse o aposentado Ortiz seria cortado com justiça. Se não o vencesse, venceria quem? Fez o que teve que fazer, sem brilhantismo ou muita emoção e continua bem longe, para sua sorte, de uma disputa contra Jon Jones. Como prosseguimento de carreira não me vem nenhum lutador em específico com o qual Rogério faria uma luta relevante. Em pé foi levemente pior que Bader, Davis, bambeou nas mãos do péssimo Jason Brilz e tomou breve calor do lento Ortiz. No chão não foi eficaz contra os wrestlers Davis e Brilz apesar de faixa preta de jiu-jitsu. Um embate contra algum TOP 10 parece fadá-lo a derrota. Lutas contra Franklyn ou Griffin poderiam ser mais equivalentes e, se saindo bem, arriscar tudo contra um dos melhores perto do final de 2012.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

ANÁLISE: UFC 139 - Henderson VS Shogun


Um UFC a flor da pele, tenso, comovente e relevante assina o começo da trilogia de mega eventos que fecham o excelente ano de 2011 para o MMA. Mesmo com Jones VS Lyoto e Lesnar VS Overeem com colisões marcadas para breve, é difícil imaginar que o ponto alto desse fim de temporada não seja o clássico instantâneo entre Shogun e Henderson. Poucas vezes violência e técnica, arte e força, lágrimas e sangue se mesclaram numa pintura tão valiosa. Uma luta para todas as gerações entre dois lutadores intermináveis. O UFC 139 ainda marcou mais uma etapa da dolorida peregrinação de Wanderlei Silva rumo a lugar nenhum e mais um carimbo no ticket de cliente VIP de disputas de cinturão para Urijah Faber. Um evento incandescente, importante, quase que um pedido de desculpas do destino pelo deprimente UFC 138.

Dan Henderson VS Maurício Shogun

Desafiando a ciência e o bom senso, Henderson vem ficando melhor com o tempo. Tão melhor que parece mais novo. A fonte da juventude é ambição. Uma motivação, um sonho, nos mantém vivos, joviais. Muito desse envelhecer vem primeiro da nossa mente, do desinteresse pelas coisas e por si próprio. Ao ser cortado do UFC após 3 vitórias seguidas, lutar desmotivado por achar que seria fácil demais e perder de modo melancólico para Shields no Strikeforce, e ouvir Dana White declarar para todos os microfones, de CNN até ESPN, que Dan estava acabado e sua carreira não tinha muito mais futuro, algo mudou. Ou melhor, voltou ao normal. Às vezes a melhor transformação é nos reencontrarmos, perceber que o caminho estava certo e dar um passo lateral para tudo ser como antes. Hendo se viu no dilema cotidiano de sacolejar a poeira e provar que é alguma coisa, ou manter um comportamento medíocre e resmungar porque os outros não o acham mais especial. Como um campeão, um atleta que venceu por todos os lugares por onde passou, de wrestling a MMA, resolveu voltar atrás e ser ele mesmo mais uma vez. Um último suspiro, um fim de carreira digno e não melancólico e risível como parece estar virando moda entre veteranos. Nocauteou Babalu, Feijão, Fedor e serviu de presente de Natal para Shogun um dos maiores espancamentos de sua vida.

Dan venceu 7 das últimas 8 lutas que fez. É, de fato, um dos maiores do mundo na atualidade. Nunca deixou de ser. Uma pessoa direta e objetiva que consegue carregar para o octagon essa essência. Muito de ter melhorado com o tempo, apesar do corpo biologicamente, irrefutavelmente, dar sinais de cansaço, é nunca mentir para si mesmo, sobre suas habilidades e qualidades de seus adversários. Prática muito comum entre atletas brasileiros. Hendo não diz ser mais do que é nem contrata uma equipe de amigos para lhe convencerem disso. Sabe que o preço das escolhas que fazemos é cobrada pela vida, e do mau treinamento, apadrinhamento e preguiça, é cobrado em sangue e vergonhas dentro das oito grades. Entendeu seu estilo, suas qualidades e limitações. Limpou o armário, fez uma faxina no seu planejamento de treinamento, reduziu o discurso, esvaziou o espírito, aumentou as possibilidades e se pôs a lapidar sua melhor arma, ano após ano, ao invés de tentar melhorar um pouco tantas outras milhões de coisas que envolvem esse esporte. Se trancou na masmorra da consciência, da realidade. Se enfurnou nos calabouços sinistros da mente de um campeão incansável, amuado, desafiado. Segurou seu machete e o afiou, no escuro, em silêncio, sozinho. Só ele e o som e o cheiro do aço quente sendo limado, aperfeiçoado. Uma navalha que não parece nada demais, mas se pegar no ângulo certo, se descer de jeito, fatia uma montanha ao meio. Dan transformou o que era um mata cobra poderosíssimo no começo de sua carreira, no cruzadinho mais letal, preciso e devastador desde que Royce se sagrou campeão do UFC 1.

O cruzado de Dan Handerson parece o Jason, lento, mas sempre chega, e quando chega todos sabem o que vai acontecer. Contra esse batido golpe, aplicado em boxe faz mais de 1000 anos, são várias as defesas, contra ataques, distâncias e técnicas que, facilmente manteriam qualquer atleta protegido e em condições de vencê-lo. Mas mentalmente não há escapatória. Seu golpe nocauteia o espírito do adversário antes, o medo de ser atingido por um golpe que já atingiu milhões, de ser a próxima vítima, de ser mais um a cair, paralisa os nervos, dificulta a passagem dos impulsos, as pernas ficam brevemente mais lentas, a guarda levemente mais reticente, o olhar que deveria estar sempre fixo pisca por um micro segundo antecipando a desgraça e pronto. Mais um tombou frente a um dos maiores de toda a existência. E foi exatamente isso que aconteceu com Shogun. Bang! Caiu como todos, mas provou ser feito do mesmo material fantástico de seu adversário, ao levantar e seguir em frente. Trampando na porrada, levando mais do que dando, mais sangrado do que sangrando. Dois machos alfa colidindo, se dilapidando e deixando pedaços de diamante pelo chão. Alguém iria acabar caindo, não era possível, mas os dois terminaram de pé. Quebrados, desidratados, amarrotados, cheios de rachaduras e hematomas. Numa fagulha do incrível que é esse esporte, se olharmos bem de perto, no grão, leremos que Dan venceu. Mas com o tempo, um grão incrível se mistura a outro e mais outro e só o que veremos é uma praia de areia quente e confortável que só existe na mossa mente. Para onde iremos constantemente até o fim de nossas vidas, cheia de memórias e momentos épicos desse esporte. Vencedores e vencidos se misturam na paixão surpreendente que temos por esse MMA.

Aceitar que um saiu vencedor é importante para prosseguimento de carreira, cartel, casamento de lutas e etc. Faz parte da parte mecânica de qualquer esporte. Mas olhar para o outro como derrotado é colocar antolhos, cela e arreios quando são opcionais. É pedir para ser montado e domesticado pela mídia sem qualidade, fãs sem emoção. Uma das melhores lutas de todos os tempos precisa de dois para acontecer. O mérito é dividido exatamente por igual.

Shogun entrou como sempre. Mentalmente preparado para encarar um exército e fisicamente rezando para a luta acabar antes do primeiro round. A falta de condicionamento do brasileiro é histórica, por mais que muito creditem isso a sua ida para o UFC, operações e erros nas estratégias de treinamento. Até em seu auge, quando se sagrou campeão do GP do Pride, saiu arrastado do ringue de tão cansado ao vencer com socos na montada Overeem depois de apenas 6 minutos de luta. Na maioria das vezes acaba ofegante mesmo em combates rápidos. Seu auge físico foi no primeiro confronto contra Lyoto, mas não teve atrito no chão, o que costuma drenar ainda mais rápido seu gás. Shogun tem um coração tão grande que ocupa o espaço dos tanques de gasolina. E foi esse seu eterno problema de condicionamento que o impediu de definir a luta no quinto round. Bater cansa mais do que apanhar, e Hendo acabou o segundo round mais cansado e Shogun mais machucado. Quando o brasileiro começou a virar o combate, esgrimir, se mover melhor e derrubar, sua resistência aeróbica cessou de vez. Seus diminutos pulmões secaram e colaram um no outro. Ao fim do quinto round não tinha nem mais forças para desferir socos com moderado impacto. E ficou por cima, quase cinco minutos, e não conseguiu canalizar energia em nenhum golpe se quer. Isso é falta de condicionamento.

Dan ter sido um wrestler tão condecorado e talentoso quase induz todos os adversários a um erro de estratégia, e não foi diferente dessa vez. A realidade é que Dan nem treina mais wrestling com freqüência, de acordo com o próprio, para poupar seu corpo, músculos das costas e joelho. Derrubá-lo é relativamente simples atualmente. Shogun, Feijão, Shields e praticamente todos que tentaram nas últimas lutas conseguiram. A questão é que poucos tentam. Acham que a única maneira é ficar em pé, parar em sua frente, e o resto da história todos sabemos. Shogun poderia ter usados chutes longos na perna mantendo a guarda alta. Víamos muito isso no K1. Cruzados de encontro como defesa, jabs para forçá-lo a abrir a guarda e etc. Mas é tão mais fácil para eu dizer isso do que ele ir lá e fazer. Não deve ser tão simples quanto acho ser e, com certeza, não aceitaria uma luta contra Henderson para provar meu ponto de vista.

Shogun estava com excesso de gordura. Roliço. Estar com a barriga pra dentro é sinal de boa forma em boates, de camisa, em esporte de alto rendimento a análise é feita por percentual de gordura (body fat). E o dele é alto demais para os padrões atuais. Deveria descer para o peso médio, onde seria um animal incontrolável. No meio pesado, no MMA atual, vai sempre estar um passo atrás em velocidade e força.
Shogun tem um carisma enorme. Por isso é tão difícil nos conformarmos com suas derrotas. Fãs esperaram literalmente anos pela sua revanche contra Coleman, clamaram por uma revanche imediata contra Lyoto, acharam justa uma nova luta contra Forrest, mesmo depois de ser obliterado por Jon Jones achavam de deveria ter outra chance e muitos afirmam o mesmo agora. Sua carreira é quase uma jornada kármica de resgate e elevação espiritual. Dan venceu o round 2 e 3. Shogun o 4. A questão da dúvida sobre a pontuação são o primeiro e último. Muitos afirmam ser justo um 10 a 8 para o brasileiro no último por dominar todo o round, mesmo não causando muito dano. Concordo. Mas a mesma lógica é ainda potencializada quando no primeiro ele foi espancado e o juiz esteve para interromper a luta duas vezes. Se dominar sem contundência o daria 10 a 8, ser dominado por espancamento e com muita contundência dá 10 a 8 para o adversário. Dan venceu a luta.

Dan e Shogun se chocaram com toda a violência e coragem que caracterizou suas carreiras, por isso são eternos. São exemplos de tantas coisas diferentes, cada um a seu jeito. Sempre acho interessante quando dois lutadores que respeito tanto se enfrentam, moralmente merecendo sair vencedores. Sem média, sem frescura, sem patriotismo, eu gostaria de apertar a mão dos dois e parabenizar por uma das lutas do século, levando em conta qualquer esporte. Dan deve pegar o vencedor de Jones VS Lyoto, ou talvez não. Depende de como ocorrer Rashad VS Davis e da recuperação da cirurgia a que Bones irá se submeter. E Shogun deve pegar o perdedor de Rashad e Davis ou o vencedor de Ortiz e Minotouro, em mais uma revanche. Independente dos adversários, os dois são sempre garantia de espetáculo, e é disso que esse esporte é feito, por isso esse esporte é magnífico e revigorante.

Wanderlei Silva VS Cung Lee

Acho que o maior presente que posso oferecer a pessoas que gosto é a sinceridade. Errado ou certo, dizer o que realmente sinto, expor meu sentimento, é o máximo que posso fazer como prova de respeito. Mil vezes uma verdade dolorida do que uma bajulação que corrompe. E é assim que me pego olhando para a carreira de Wanderlei. Um dos maiores, merece todo o respeito e até um certo carinho pelo que fez. Noites e madrugadas de alegria e emoção como poucos atletas vão vir a fazer. Lutas cheias de sentimento e adrenalina e veias hipervascularizadas, e raiva, e alegria, e violência e vitória e depois, paz. Foi como nenhum jamais vai ser, único, emblemático, importante. Um daqueles que arrastou o esporte pelas correntes quando ninguém queria realmente ver, e muitos queriam que deixasse de existir. Wanderlei fez mais do que imagina, daqui a 50 anos vai ser mais fácil perceber. Mas hoje em dia, não faz mais nada. Está numa constante peregrinação para lugar nenhum. Não tem como vencer grandes lutadores para disputar o cinturão, mesmo que vencesse não gostaria de enfrentar seu amigo Anderson Silva e não tem interesse em luta com adversários desconhecidos. Vem apanhando muito mais do que batendo e quase à toa. 6 derrotas nas últimas 9 lutas, 4 por nocaute. Apenas 3 vitórias em quase 6 anos. Um cartel recente ridículo até para padrões de atletas de baixo nível. O cachorro loco continua querendo morder carnes que o maxilar não consegue mais dilacerar. Confunde a paixão dos fãs pelo que foi com a vontade de continuar sendo. Quer dar alegrias, continuar no combate. Mesmo com filho e família, ainda entra para a porrada mesmo, sem medo de se ferir ou coisa pior. Isso é comovente. Cada luta sua é um último suspiro, tão difícil, os pulmões afogados, a correnteza tão violenta, qualquer vitória é uma catarse. Venceu Cung Lee. Não fez nada demais, não muda nada na história do esporte nem do UFC atual, mas foi muito emocionante.

Cung Lee poderia ter sido um lutador fantástico tivesse começado a carreira 25 anos antes como lutador profissional ao invés de artista de cinema. Hoje em dia, gordinho, velho para o esporte, com família, sem ritmo ou implementação de tecnologias modernas no treinamento e com a ambição de ser campeão de um senhor na corrida do ovo na gincana da escola da neta, não impôs muita resistência. Tem uma movimentação excêntrica, sui generis, o mais próximo do ballet que MMA pode chegar e ainda ser contundente. Um dos lutadores mais intrigantes de vermos lutando, mas não deveria ser capaz de impor desafio real a um atleta de alto nível. Mas impôs. Até porque Wand não luta mais em alto nível.

Essa era a luta pela qual eu estava mais ansioso. Um casamento instigante entre técnica e agressividade. Quem não acompanhou a breve carreira de Cung Lee não curtiu a expectativa desse confronto, e talvez nem tenha entendido bem como pode ser tão competitivo e impor tantas dificuldades técnicas para o adversário. Cung Lee 20 atrás VS Wand do Pride seria uma das lutas do milênio. Mas nessa dimensão luta assim nunca ocorreu e o que tivemos foi habilidade tentando superar despreparo e idade, contra violência e paixão tentando superar a queda técnica e física. Um canto do cisne, uma luta bonita de ver, um bailado violento e letal, onde venceu o lutador de verdade. O livro pesou sobre uma página.

Wanderlei vibrou, chorou e mereceu. Não sou amargo nem canalha para querer tirar o mérito dessa sua glória. Se a vida é feita de pequenos momentos, se ser feliz é um aglomerado de milhares de alegrias, que pode ir de um beijo na namorada até um abraço no pai, o que diria de uma vitória no UFC? Que ele curta e vibre de coração cheio. Que os fãs o tratem com a emoção e cuidado que ele fez por merecer de tanto destruir os outros e a ele próprio pelo nosso prazer. Mas sua carreira está no final. Está a uma derrota contundente de ser cortado por Dana White, ele sabe, nós sabemos. E do jeito que ele está, sem queixo, menos resistente, com menos punch, para essa derrota não vir terá que fazer luta contra atletas medíocres e seu espírito guerreiro não vai aceitar. Pedirá por grandes combates. Revanche contra Belfort, Leben e etc. Lutas que dificilmente terão resultado diferente da primeira. Não imagino Wanderlei agüentando se aposentar vencendo. Enquanto estiver tendo a mão levantada, vai continuar. Nada vai pará-lo. Será até o fim como sempre foi desde o começo. Por isso antevejo o ponto final de sua carreira ao som seco de um direto no queixo e aplausos para o outro. Foi assim com tantos, deverá ser assim com ele. Parece ser o único caminho que os maiores encontram para parar. Os maiores deixarão o octagon ou ringue pela última vez tristes, sempre tristes. Porque uma gotinha sequer de alegria que seja vai fazê-los querer voltar, como um pingo de sangue revive o vampiro.

Cung Lee contra Leben e Wanderlei contra Maia são duas lutas que eu amaria ver antes do fim.

Urijah Faber VS Brian Bowles

Faber é um lutador incrível. Excelente em todas as áreas, veloz, carismático, bem humorado, raçudo, agressivo dentro do octagon, educado com fãs e mídia fora, com boa aparência e cabelos dourados para fazer comercial de shampoo traduzido em 5 línguas. É o pacote completo. De capa de revistas de boa forma, leilões beneficentes até main events. Faber faz de tudo, até ajudar jovens carentes com uma instituição de caridade ligada a sua equipe Alpha Male. Como não gostar do cara? Ou se isso não for suficiente para admira-lo, por que torcer contra? Não há real motivo para querermos atrapalhar seu caminho natural que parece ser positivo para todos os envolvidos. E para os fãs de MMA Faber faz exatamente o que um grande atleta deve fazer. Sempre boas lutas com entrega total e voracidade. A única coisa incômoda a respeito de sua pessoa é como, luta sim, luta não, disputa algum cinturão. Como se ele, por ser tudo isso acima e ainda muito mais, não pudesse, jamais, não ser o campeão absoluto de algum peso. Depois de perder o cinturão do WEC para Brown, 8 lutas antes dessa, já disputou o cinturão 3 vezes. Levando em conta que na primeira luta contra Mike Brown ele era o atual campeão, foram 4 lutas por título nas últimas 8. Se esse texto fosse uma conversa informal por MSN teria escrito agora um: “rsrsrsr” ou um “kkkkk”. Faber tem carteirinha VIP de desafiante ao título e isso me chateia como fã, imagine o que não pensam os outros atletas do peso. Não gosto de opinião tendenciosa, patriotismo ou apadrinhamento. São vírus que destroem a competição honesta e escalonamento de combates. Por conta disso o excelente Renan Barão, e outros, vão ficar sentados na calçada esperando a festa do granfino acabar.

Brian Bowles é excelente. Um dos 5 melhores atletas do peso e um desafiante digno ao reinado de Cruz, tivesse passado por Faber, proeza das mais difíceis e um pouco acima de suas estelares habilidades. Faber foi mais violento, maior, manipulou Bowles sem vergonha nenhuma e acabou fácil com um atleta que é adversário dificílimo para quase todo mundo. Brian deve pegar Barão ou Demetrious em combates que já tem o bicho de luta da noite praticamente garantido. E Faber, se perder para Cruz, estará mais uma vez a uma vitória de distância de disputar algum cinturão mais uma vez. Seja numa revanche contra Aldo, que estando tão lento tem chances de ser vencido pelo California Kid, coisa que parecia impossível ao final da primeira luta, ou até descer para disputar o título do ainda nem introduzido no UFC peso mosca. Se depender disso para Urijah ter algum cinturão, não se preocupem, em 2012 teremos uma nova categoria no UFC.

ANÁLISE: UFC on FOX 1 - Velasquez VS Cigano


UFC on FOX foi uma carimbada firme no contrato que MMA tem com a emoção a flor da pele. A primeira luta do UFC em canal aberto nos EUA também foi a mais assistida de todos os tempos com picos de 8.8 milhões de espectadores apenas no país. O primeiro evento, a primeira luta, rápida e arisca, rasgando convenções, deixando cicatriz que o esporte deveria ter orgulho de empunhar. Uma luta antológica mais pelo que representa, do que pelo que vimos, mais importante em 1 ou 2 anos do que agora. Royce Gracie, em 1993, sozinho, franzino, com sangue no kimono, começou a erguer as fundações do que depois conheceríamos como MMA. Fedor, Sakuraba, Minotauro, Wanderlei, Anderson, Liddell, Couture e outros fizeram desse o esporte mais apaixonante já inventado. No ano em que MMA chega a maturidade,Cigano, numa porrada só, eterniza o esporte e pavimenta caminho para mais 18 anos.

Cain Velasquez VS Junior Cigano

Difícil falar de um combate tão importante quando praticamente não houve luta. Tanta expectativa para alguns chutes na perna, um mata cobra, alguns socos no chão e pronto. Basicamente isso resume a disputa pelo cinturão do pesado. Apesar de Joe Rogan e outros entusiastas apontarem qualquer nocaute como grande combate, pra mim, os maiores vem de ataques e superação dos dois lados, reviravoltas e alternância de momentos emocionantes. Quando só um luta podemos curtir a vitória se for para quem torcermos, ou lamentar a derrota caso contrário. Se na prática não aconteceu nada do que eu ou Dana White esperávamos, verdade que esse nocaute veio na medida quase exata.

Ficou claro para quem acompanha a carreira de Cain Velasquez que ele estava diferente. Tavez por estar um ano parado por conta de lesão. Um lutador gélido e calculista demonstrava nervosismo descarado, despressurizando com seqüenciais pequenos assopros a tensão que lhe esmagava o esôfago. Sempre parrudo, desta vez entrou fora de forma. Os braços ainda ostentavam um excessivo percentual de gordura que atletas de ponta não devem carregar, mas com muito menos massa muscular que o seu normal. Do peito antes trabalhado, mas sem definições ou compromisso com estética, agora dependuravam-se duas papinhas de pele excedente. Atleta de alto rendimento sente as oscilações de seu corpo, costumeiramente reflexos de erros, lesões ou falhas na preparação física e programa de treinos. Velasquez não era nessa noite o mesmo que foi em tantas outras quando achamos ser um dos maiores do planeta. Modorrento, reticente, atrofiado. Um atleta que era o mundo todo entrou apenas México. Acabou dormindo, tirado para lutador de bar, caído de qualquer jeito, espatifado.

Velasquez não foi nem rascunho do lutador que nos encanta. Independente de nacionalidades, torço para o espetáculo, emoção. Adoraria vê-lo tombar e não ser empurrado para o chão. Torci por um grande combate, não por um soco, mas nada disso arranha a performance de Cigano. A luta para um atleta começa na preparação, nos dias de treinamento, na superação de problemas pessoais, dores, lesões, tristeza, desmotivação, dieta, dedicação e tantas outras coisas. Sob os holofotes e câmeras, no octagon, é apenas a cereja do bolo, a copa da árvore, um ponto no final. Interrogação para Velasquez, exclamação para Cigano. E se Cain começou a perder sua luta meses atrás, problema dele, porque Cigano vem vencendo todas desde que nasceu.
Das 14 vitórias de Junior Cigano, 10 são nocautes no primeiro round, e os dois únicos que aguentaram os três rounds até o final, Roy Nelson e Shane Carwin, foram acarinhados com a maior sova de suas vidas. Desfigurados, espancados, talvez tenham em segredo até desejado que tivesse acabado antes. Cigano é o peso pesado mais temido do planeta, não pelo que fazia, como Wanderlei, ou pelo que sempre parece poder fazer, mas nunca faz, como Frank Mir. É temido pelo que faz, luta após luta.
Cigano lutou como sempre, com o olhar reto e fundo de quem fita o horizonte através da carne do adversário. Tão certo do que vai fazer, tão confiante e preparado que parece maior do que é. Cain, Minotauro, Mir, Nelson, Carwin, Struve, Overreem, Kongo, Mitrione, Schaub e quase todos os pesos pesados do UFC são mais pesados que ele. Mesmo assim figura emblemático e imponente dentro do octagon. Um monólito. Não é dos melhores em jiu-jitsu nem especialista em wrestling. Tem um excelente boxe, movimentação e distância. Mas é a vontade com que se entrega em cada golpe, pra rachar qualquer pedaço, e entrar por qualquer fresta, e fazer estrago, devastar, derrubar o sistema, que o torna genuinamente perigoso. Luta por tudo o que ama como se não tivesse nada a perder. Com o ímpeto de quem quer alguma coisa demais, e a leveza de quem não quer nada mais.
Cigano nocauteou o invicto Velasquez e fará o mesmo com qualquer outro que confunda idiotice com coragem, e queira se meter por entre o frenesi e ódio justo de seus punhos.

Enquanto Anderson luta em Aramaico, Cigano luta em inglês com tradução simultânea. Faz o que qualquer um entende, pacifica a confusão que é a mistura de artes no MMA na porrada, fala a linguagem universal da mão na cara. Pode fazer pelo esporte o que Mike Tyson fez pelo boxe. Enquanto o esporte ainda estiver crescendo e buscando novos fãs, campeões como Cigano, que simplificam as regras do jogo, tem uma importância além do cinturão.

Quando o planeta todo estava vendo, quando não dava para ratear, quando apenas ter feito o melhor não seria suficiente, provou que sua pólvora nunca está molhada, que nunca falta sonho nos seus olhos, sangue nas veias, má intenção nos seus movimentos, entrou, farejou, largou a mão, nocauteou. Simples assim. Na circunferência do cinturão de campeão que agora carrega, cabemos todos nós dentro. Um campeão do povo, compreensível, direto, sem falsa modéstia, sem discurso decorado. No UFC on FOX Cigano não mudou nem inventou o MMA, isso é mérito de outros, mas mostrou do que esse esporte é feito.

Ben Henderson VS Clay Guida

Se iriam transmitir apenas uma luta ao vivo em rede aberta, tinha que ser essa. Se é verdade que ninguém poderia afirmar que a luta entre Cain e Cigano seria tão rápida e estéril, é fato que Ben e Guida eram garantia de qualidade o tempo todo. Uma luta emocionante, com chances de vitória para os dois, violência, técnica, surpresas, socos, joelhadas voadoras, knock downs, recuperações, finalizações justas e jogo de chão agressivo. Isso é MMA em sua forma mais completa. Se era para os espectadores de todo o mundo acabarem o evento na FOX achando que tinham visto alguma coisa fora do normal e entendido porque MMA é o esporte que mais cresce no planeta, quase nenhuma luta poderia superar essa que foi uma das 3 melhores do ano.

Ninguém mete a porrada em nome do Senhor melhor que o religioso Ben Henderson. Incrível a disposição que o “suave” (tradução literal de seu apelido “smooth”) tem para ser ríspido com os adversários. Sem perdão ele faz uso de seu wrestling de campeão All American, sua faixa preta de tae kwon do e marrom de jiu-jitsu para subjugar seus adversários em todas as áreas. Guida é veloz, ativo, disposto e com um preparo físico incrível, mas Ben o supera em todas as áreas. Talvez o lutador mais bem preparado fisicamente e mentalmente do esporte na atualidade. Grande e pesado para o peso leve, com um corpo esguio e sem gorduras, pulmões com gás para duas lutas por cinturão e uma calma e controle mental de monge tibetano. Muitos atletas batem em chaves mal encaixadas por entrarem em pânico, prejudicando a entrada de ar ou simplesmente achando que não dá para escapar por mais que saibam como. Henderson não perde a meta, não tem medo, não fica ofegante. Uma máquina de combate, calmo na análise das brechas e superação de dificuldades, extremamente agressivo e voraz na busca pela vitória.

Um lutador legitimamente completo, capaz de vencer qualquer adversário tanto em pé, no chão, como numa batalha por controle físico nas transições, como foi grande parte desta com Guida. Suas últimas vitórias foram domínios físicos sobre 2 dos atletas mais viris e determinados da atualidade. Jim Miller e Clay Guida que simplesmente não desistem, não param, não sentem dor ou cansaço, foram amarrotados e controlados como criaturas de uma cadeia alimentar inferior por Henderson.

Frankie Edgar terá o maior desafio para sua velocidade e audácia contra Ben, no UFC Japão, quando disputarão o cinturão dos leves. Se Edgar vencer, depois de ter vencido Penn e Maynard, seria bom que os detratores e ranhetas parassem de confundir sua falta de carisma com sua qualidade técnica, e o aceitassem como um dos maiores lutadores peso a peso do mundo. Caso Ben seja o vencedor, antecipo um reinado duradouro e com várias lutas incríveis, uma após a outra. Dê o que der, o fã sairá vencendo dessa que já é uma das lutas mais antecipadas do ano.

Clay é um vencedor da vida como nunca será no octagon. Contando sempre com seu preparo físico, carisma e complacência dos juízes que tantas vezes o permitiram debruçar sobre um adversário, sem fazer muito mais do que se defender de ataques e jogar seus cabelos na cara como arma secreta, Guida foi bem longe na carreira. De lutar em cards preliminares esquentando o ânimo do público, para lutas de meio de evento, para aberturas de evento, para ser tornar um postulante ao cinturão é mais do que poderia sonhar, se seus sonhos tivessem algum embasamento na realidade.
Vez em quando um atleta que está na organização faz tempo tem a chance de encarar alguém muito mais bem ranqueado. Nesse caso é muito mais usado como boi de piranha, degrau para esse melhor atleta do que um genuíno desafiante. Tanto que suas vitórias acabam configurando zebras. E durante anos Guida não foi zebra. Sempre perdia mesmo quando encarava um TOP 10 genuíno. Din Thomas, Tyson Griffin, Huerta, Sanchez, Florian. Todas derrotas em chances de realmente subir na organização. Sua sorte começou a mudar após a vitória inesperada sobre Raphael dos Anjos, onde um fracasso poderia acabar com um corte do evento ou volta para cards preliminares. Depois venceu um melancólico Takanori Gomi e prendeu contra a grade, com ajuda do juiz, o explosivo Anthony Pettis. Três vitórias fora do roteiro o colocaram o mais longe que chegou e chegará na carreira, a um passo da disputa pelo cinturão. Um passo pra Henderson, um duplo mortal carpado para Guida.

Clay Guida é muito importante para o MMA show pela sua disposição e entrega aos combates. Colocá-lo frente a um atleta realmente superior, é certeza de luta boa, porque será dominado, apanhará, e jamais vai se entregar. Mas se o adversário for inferior, ele colocará pra baixo e ficará se esfregando de modo constrangedor até que o bom senso nos leve a mudar de canal.

ÚLTIMO ROUND: Para quem acha que MMA nunca tinha passado ao vivo no Brasil até as transmissões recentes da Globo e RedeTV, vale lembrar que a luta entre Belfort e Liddell, no UFC 37.5 (sim, trinta e sete e meio), em 2002, foi transmitida pelo SBT.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

ANÁLISE: UFC 138 - Munoz VS Leben


Em minhas análises não tenho como escrever sobre todas as lutas, o que seria meu sonho. Um dia, com apoio financeiro ideal, talvez eleve minhas criticas pós evento ao nível que sempre quis. Com todas as lutas comentadas para cada um ler o que quiser. Quantos atletas iniciantes se beneficiariam de ter suas lutas imortalizadas de alguma maneira, quantos fãs se divertiriam com o passatempo de ter tanto mais texto para ler em dias sem nada para fazer. Mas, no momento, não tem como ser assim. O que faço então é sempre cortar as menos importantes do card principal ou a de lutadores que considero irrelevantes. Costumeiramente dois desses são Leben e Munoz. Não falo deles, não faço questão de escrever sobre suas performances e me parece que poucos tem algum interesse em vê-los lutar ao vivo, quanto mais ler alguma coisa. Por dardo envenenado da zarabatana do destino fui atingido na jugular, paralisado em meu direito de optar e forçado a escrever sobre esses dois num main event de UFC. Só assim mesmo. Tombo meio morto sobre o teclado, me arrasto para as letras, passo zunindo para longe do meu melhor, sem motivação ou inspiração, martelo minha própria mão na cruz para arrumar o que dizer da pior luta principal desde que a Zuffa adquiriu o Ultimate Fighting Championship.

Mark Munoz VS Chris Leben

Dá para farejar o cheiro do desespero de Dana White para fabricar algum desafiante ao cinturão de Anderson Silva. O que tem a sua disposição são atletas derrotados e desmantelados pelo campeão, mas que insistem em afirmar merecer uma nova chance, ou outros medianos e sem chance real alguma. Desse parto aflito e indesejado, nasce Leben VS Munoz. Uma luta comum, de meio de card, aquele momento todo especial em que a namorada vai ao banheiro e nós preparamos a pipoca. Ou ela vai ao banheiro e depois prepara a pipoca enquanto nós ficamos no twitter. Tanto faz. Essa luta, esse rejunte de tijolo, esse pedaço de alguma coisa, é o grande combate do UFC 138.
Luta principal deve ir além de ser a mais importante do card, deve ser relevante para o MMA naquele momento. Usar os holofotes para nos convencer de que dois lutadores esforçados, porém comuns, são TOP de sua categoria é olhar nos olhos e mentir. Não importa o vencedor, as lutas interessantes que cada um deles poderia vir a fazer depois seriam pela nossa diversão, não por almejarem algo maior em suas carreiras no UFC. Munoz VS Sonnen seria uma boa luta, Leben VS Belfort também. Pelo show, não em main event e muito menos com o discurso de poderem lutar pelo cinturão. Entendo a posição complicada de Dana White e o matchmaker Joe Silva. Os fãs demandam um adversário a altura para Anderson, mas esse atleta não existe no peso. Tem gente talentosa, mas já sucumbiram uma vez e não fizeram nada demais depois para merecer outra chance. O relógio não para, Anderson está envelhecendo, tem lutas que precisam ser feitas por contrato e nenhum claro contender. É uma situação delicada, eu sei, mas não me interessa. Leben VS Munoz não podem ser evento principal.

Munoz é um lutador esforçado, um cara aparentemente gente boa e o grande representante da terra de Pacquiao, Filipinas. Seu valor mercadológico é imensurável caso se torne campeão ou consiga real destaque, mas seu peso como atleta é leve, apesar de lutar no médio. Só tem duas derrotas, mas foram contundentes e emblemáticas. Nocauteado com um chute na cabeça por Matt Hammil que nunca tinha dado um chute alto em sua carreira profissional, e completamente dominado por Okami, apesar de que para quem só olha o cartel no Sherdog sem ter visto a luta, dar a impressão de que perdeu por pouco. Suas vitórias foram sobre lutadores medianos e sem contundência. Um atleta pode mostrar que é especial lutando contra adversários medíocres, desde que os desmantele, destrua, use cada segundo do combate para demonstrar coisas incríveis e superioridade, a exemplo de Renan Barão. Não é o caso de Munoz. Alguns nocautes depois de apanhar e ser dominado por adversários sem muito talento, como foi contra Grove, ou vitórias arrastadas por pontos, mais recentemente contra Maia. Um lutador mais empolgante falando do que lutando. Displicente, com um boxe extremamente obtuso, um bom wrestling, bom gás, e só. Suficiente para lutar no UFC e dar alguns shows, mas jamais desafiar o campeão.

Leben tem coração e queixo para lhe proteger de sua guarda esburacada de primeiro mês na escolinha de boxe, e alcance atrofiado. Parte pra cima, pra decidir, e só não proporciona melhores shows porque carrega em torno de si uma aura de irrelevância constante. O que faz ou deixa de fazer não parece sacudir nem um farelo de poeira no mundo do MMA. Até sua vitória sobre Wanderlei gerou mais comentários sobre a carreira do brasileiro do que o futuro do vencedor. Leben é um trabalhador do esporte. O Gary Goodridge dos tempos modernos. Vai sempre estar ali, aparece no fundo de foto que nem em filme de terror japonês, mas nunca será realmente lembrado. Já teve sua chance contra Anderson e foi humilhado. Leben apanhou, em pé, de Bisping, como um amador apanha de um profissional. Para os que não assistiram terem idéia de como os comentários de que ele teria talento para disputar o cinturão são uma fraude da mídia do UFC.

Esses dois colidiram sem brilho no UFC 138. Pedra contra pedra sem fagulha. O que era para ser um show violento de trocação, uma luta visceral entre dois lutadores sem relevância em busca de um sentido na carreira, foi uma demonstração desprezível de tática sobre emoção. É o b a bá mais batido do esporte. Dois lutadores que adoram trocar, mas nenhum tem real vantagem na área, então o wrestler derruba e controla. Tudo bem. Problema de Leben que nunca treinou defesa de queda, mérito de Munoz que lutou para ganhar e que se dane o espetáculo. Se GSP pode fazer isso durante anos e ser considerado um dos melhores do mundo, porque seria diferente com ele? Foi, fez, derrubou, cortou Leben com alguma cotovelada ou soco, e a luta foi interrompida ao final do segundo round.

Ao contrário do que alguns comentaristas afirmaram, não foi por decisão médica a interrupção da luta. Leben declarou não estar conseguindo ver de um dos olhos. Quando o juiz pergunta: “quer continuar?” e o atleta diz: “até quero, mas estou cego de um olho”, ele está desistindo da luta. É um código não escrito entre lutadores. Quando realmente querem seguir em frente, escondem a lesão, mentem sobre a dor. Leben contou sobre sua dificuldade para forçar o médico a parar e não ser dada derrota por desistência, e sim interrupção médica. Acho normal que ele não quisesse continuar e acabar cego. É um esporte, não uma batalha até a morte. Mas foi Leben que pediu para parar por conta da eficácia dos golpes de Munoz.

Munhoz fez o que acha que deveria fazer. Amontoou mais uma vitória e continua em frente. Um lutador que vai estar sempre mais pronto para agarrar as oportunidades que passam do que fazê-las aparecerem. Anderson esterilizou o peso, esturricou a floresta, ordenou o holocausto do peso médio. Uns poucos sobraram por entre os escombros. Mark é um desses. Com luta marcada contra Sonnen no UFC on FOX 2 pelo direito de desafiar Anderson Silva, se encontra no momento mais alto de sua carreira, porque de Sonnen não passará.

Renan Barão VS Brad Pickett

Barão e Pickett tem carreiras quase siamesas. Os dois perderam pouco, venceram muitas lutas sobre adversários sem expressão, mas de modo contundente e dinâmico. Toda luta em que um dos dois esteve envolvido foi interessante de assistir. Coragem, resistência e perseverança são qualidades que os dois compartilham, mas Barão luta na velocidade da luz. E é nessa curva do talento que vem pegando tantos adversários do galo, o peso mais veloz do UFC. Quase todos os lutadores são atletas perfeitos, habilidosos em todas as áreas, sempre cheios de gás, queixo e ímpeto para vencer lutas a 100 por hora. É o talento, a genialidade, que separa os tubarões das vítimas a serem abatidas.

Pickett fez estrago e deu show por onde passou. Marcou história no Cage Rage, sempre foi competitivo no dificílimo WEC e continua mantendo o padrão de ataque e comprometimento até hoje. Foi pra cima de Barão, como fez em toda a carreira, sem timidez, sem passo para trás. Atacou e atacou até que acabou perdendo rápido, como se perde numa luta entre atletas desse nível quando dispostos a se exporem. Pickett corta a gordura do combate, o papo furado, se é para perder que perca rápido, se é para ganhar vai tentar fazer logo. É isso que faz e faz muito bem. Ainda vai ter boas e interessantes lutas na carreira, mas está um nível evolutivo abaixo de Cruz, Faber e Renan.

É intrigante porque o excelente Barão demorou tanto para entrar no WEC, de onde migrou para o UFC. Tendo apenas perdido sua luta de estréia e já colecionando 27 vitórias aos 24 anos de vida, é um dos maiores lutadores do mundo, independente de peso. Poucos saberem disso mostra como foi importante o UFC introduzir para a grande mídia os pesos galo e pena, e o impacto que traria se incorporasse o peso mosca e a categoria feminina. O UFC é para o mundo do MMA o que a Globo é para o Brasil.
Barão é um dos 10 melhores lutadores P4P do planeta, muito mais merecedor de se dilapidar contra Cruz do que Faber, que tem carteirinha VIP para disputas de cinturão. Com Cruz e Faber como técnicos do novo TUF, Renan ainda terá que esperar um pouco e maltratar mais alguns adversários. Ele contra o super veloz Demetrious Johnson não só forçaria sua entrada na festa de granfino dominada por Faber e o pessoal da Alpha Male, como teria que ser gravada e assistida em câmera lenta para podermos ver alguma coisa.

Thiago Alves VS Papy Abedi

Thiago vinha de 3 derrotas nas últimas 4 lutas. Só uma vitória contra o invicto Papy Abedi poderia salvar sua carreira no UFC. Fato que encontraria casa no Bellator, Strikeforce ou qualquer outro bom evento disposto a se beneficiar de um atleta extremamente carismático e com estilo de luta agressivo. Mas é no maior dos eventos que ainda quer figurar, e partiu para cima, para definir o melhor rumo de sua carreira. Entrou bem preparado, focado, obstinado, mas lutou mal e o resultado poderia ter sido bem diferente não estivessem os pequenos deuses do MMA olhando por ele naquele dia.

O cartel invicto e cheio de nocautes de Papy Abedi dá a falsa impressão de se tratar de um futuro grande lutador. Na verdade é um trocador bem disposto, viril, e não muito mais. Sem maiores recursos do que ficar em pé, intimidar o adversário com seu excesso de fibras musculares e trocar até um cair, é um atleta sem grandes pretensões no evento. Deveria ter sido presa fácil para o Pitbull, mas não foi.
Thiago só quer trocar, fato. Mas depois de ter dificuldades em pé com Rick Story, as mesmas se manifestaram contra Papy. Costumeiramente reclamava tanto dos atletas temerem seus punhos e fazerem o clássico “se ele soca eu derrubo”. Mas atualmente até no boxe ele anda tendo bastante dificuldade.

Venceu por finalização uma luta franca que poderia ter ido para qualquer lado. Por mais que ame muay thai, foi jiu-jitsu que o salvou, aplicando um estrangulamento instintivo, ao invés de sucumbir ao desejo sempre sedento de dar mais e mais socos.
Os dois vão seguir a carreira no UFC com altos, baixos e muitos médios. Não irão muito longe e não ficarão muito para trás. Ainda veremos grandes lutas dos dois e diremos muito que suas carreiras estão perto do fim. Fato é que todo evento precisa de atletas francos e explosivos como Alves e Abedi.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

ANÁLISE: UFC 137 - Diaz VS Penn


Como um gol no último minuto, Diaz e Penn salvam esse UFC 137 de ser o evento mais desnecessário e irrelevante do ano. Poderiam dividir os méritos com Cerrone e Siver caso a direção do UFC não tivesse optado por colocar dois dos maiores lutadores do mundo no card preliminar. Entendo que a última luta transmitida antes do evento pago deve ser boa e motivante para induzir os compradores ainda relutantes a aderirem ao pay par view, mas nunca à custa da sangria do card principal. Levemos em conta que aqui no Brasil temos uma transmissão estelar do canal Combate com todas as lutas, mas nos EUA e resto do mundo, a realidade é bem diferente. Um fã que assine o pay per view do main card, mas não seja assinante da SpikeTV, simplesmente não assistiu 50% do melhor do que o UFC tinha a oferecer nessa noite.

Nick Diaz VS BJ Penn

Quando Diaz flexionou os bíceps, se abrindo como uma naja, escurecendo BJ sob sua sombra imponente e desrespeitosa no dia da pesagem, a luta já estava meio ganha. O veneno que Nick destila no olhar já corria nas veias de Penn quando se encontraram no octagon. Semi paralisado, intimidado, o ex campeão do UFC ofereceu muita resistência e raça, mas pouco perigo ao campeão do Strikeforce.

BJ Penn é bipolar. Tem algum disjuntor em alguma parte de seu espírito que arma e desarma sem aviso. O mesmo pode ser um dos atletas mais perigosos de todos os tempos, capaz de tirar Sherk, Sanchez, Florian, Hughes pra nada. Derrubar e dominar com autoridade o indômito Jon Fitch. Ou ficar estéril, de olhar perdido e duvidoso. Não conseguir mais impor seu jogo contra esse mesmo Fitch, 1 minuto depois de ter feito com ele o que queria, ser completamente dominado por Edgar, contra quem havia feito uma luta extremamente dura meses antes ou ser esmagado que nem papel molhado por GSP sem esboçar nenhuma reação. É o melhor do mundo ou um qualquer. Azar ou sorte de quem está do outro lado, já que o mistério do que o transforma ninguém desvendou.

Penn só ganhou 3 de suas últimas 8 lutas. Por menos que isso muito lutador já foi cortado. Não defendo a remoção de uma lenda como essa do UFC por más performances, até porque só compete contra atletas de alto nível, mas é fato que sua carreira está no último e descendente arco. Não fosse uma pessoa tão intensa, de discurso e carisma tão fortes, com tantos fãs que insistem em acreditar que agora ele vai voltar a ser como antes; como acreditaram em Couture, Hughes, Crocop, Fedor, Sakuraba e outros; Já não despertaria real interesse pelas habilidades que vem apresentando. BJ parece entrar para lutar com a cabeça em outro lugar, com os pensamentos no Hawai, na esposa e filhas. Não acho errado, não o culpo. Depois de anos fazendo tanto pelo esporte, se colocando em risco, cada vez mais o que lutou para construir parece ficar para trás nos meses da luta. O sonho de ser campeão, e a preparação que era o caminho duro e necessário para o maior momento, vira o sonho de manter a família e curtir as glórias merecidas. Antes o sonho estava na frente, no fim do caminho para o dia do combate. Agora, a cada dia de treino, o sonho vai ficando mais longe, lá atrás, em casa. No dia do UFC, dentro do octagon, está o mais distante que pode estar de tudo que realmente preza e ama agora. Grande parte de seu coração está não está ali. Apesar do espancamento, BJ vai voltar a lutar, seja pelo contrato, seja porque veio a esse planeta para isso. Mas sua declaração ao microfone, sangrando e amarrotado, de que essa era a última, que não queria que sua filha o visse dessa maneira, soou mais sincera do que qualquer uma de suas recentes performances.

Começou o combate bem, fazendo frente ao ainda jovem, maldoso e tenaz Diaz. Mas a cada soco lembrava de outras coisas, de porque não queria mais isso tudo. E desistiu. Continuou de pé, como um homem ciente de sua moral e responsabilidade, como um verdadeiro campeão que carrega o cinturão invisível em todos os momentos, e deixou seu corpo abalroar. Pelos fãs, pelo que diz que é, pelo que sabe que já foi, pela sua família, respeito ao adversário e tantas coisas que compõe um atleta íntegro. Entregou sua carne ao abutre e desligou o sentimento. Foi eviscerado, violentamente e sem piedade, morrendo no deserto, estirado e fitando o sol, mas não sentiu dor. Só ossos e nervos como testemunhas. BJ agüentou até o final uma luta que já parecia saber o resultado no dia da assinatura do contrato.

Diaz não tem essa. Não tem pena, não tem medinho, não tem olhinho cheio de água, não foi a lenda que BJ é e não está nem aí. Se guarda sentimentos positivos, esconde bem porque não consigo encontrar em nenhum lugar. Se tem medo, não aparenta. Parece recheado de má intenção, de ódio, frustração, revolta. Diaz arranca um pedaço quando dá bom dia. Não tem respeito, não faz show para câmera, não faz cara de mau para as fotos. Se não fosse lutador, seria bandido ou alguma coisa do gênero. É o anti herói. Não gosta de dar autógrafo, não quer ser exemplo, não quer ser capa de revista, não é bonito, não treina para ficar sarado, não fala coisas legais depois da luta. Diaz veio para confundir. É puro em sua intenção única de desmantelar o adversário.

Seus olhos todos pretos encravados fundo na cara, sua coluna torta, seu queixo proeminente, seu cabelo ruim, sua boca suja, sua índole péssima. São características do homem que veio a esse planeta com a missão de salvar o MMA espancando Georges St. Pierre.

Nick Diaz, que migrou da vagabundagem para o MMA por falta de opção, sente que esse é seu destino. Vencer Pierre, destronar o campeão que quer transformar MMA em aula de matemática, mostrar que esse esporte é visceral, feito de mais do que apenas vitórias e análises de cartel. E GSP vai apanhar e sangrar na ponta dos cotovelos de Diaz. Eventualmente retomará o cinturão, é um lutador melhor, mas já terá sido manchado e o MMA salvo. Diaz sente que é seu destino, está ali para ele pegar tranquilamente e mesmo assim quer na marra. E foi pra cima de Penn como quem vê o futuro. E sem medo de levar diretos de um dos melhores boxers do esporte, agüentou e atacou. O masoquismo de Diaz é sua arma secreta. Gosta de apanhar, só respeita a dor, um marginal de espírito. E apanhou, fechou a cara, e continuou. Sem vergonha de contra golpes limpos que só entram porque a guarda é falha, sem medo de perder com um cruzado no queixo, sem pensar nas novas cicatrizes. Imprensou Penn nas grades e o esmagou como um tsunami contra um recife de corais. Fez como ninguém havia feito, venceu a luta mais importante de sua vida e nem ligou. Sob aplausos não curtiu a glória durante nem um segundo, desgraçado esnobou todo mundo, e clamou por GSP. Quase um messias.

Diaz se tornou um dos maiores do mundo brutal e lentamente. Sangra em quase toda luta, aceita a troca franca, aceita o jogo de chão. Não tem tempo bom. É um lutador doído, amado em segredo. Quando tiramos a mídia, o show de luzes, o marketing, os discursos decorados, a falsa modéstia, a estratégia medrosa, a amarração, a hipocrisia e a luta para pontuar, sobra no meio do octagon apenas Diaz. Cru, real, direto. A célula mãe do que nos faz amar esse esporte, sem maquiagens. Luta pra ganhar, sempre, em qualquer lugar, sem cagaço, sem mi-mi-mi.

Penn merece um lutador pouco menos talentoso para poder se aposentar com vitória. Se ele não quer mais essa vida, não tem porque ser exposto para os novos e ainda desinformados fãs confundirem seu pior momento com o grandioso competidor que foi. E Diaz espera, de braço cruzado, emburrado e fumegando ira, o seu destino ser completado.

Cheik Kongo VS Matt Mitrione

Cerrone e Siver estarem no card preliminar e esse ser o co-main event parece pegadinha. Kongo pode perder mil vezes que enquanto não perder a nacionalidade francesa, continuará no UFC com pompa de top 10. Mitrione poderia ter se tornado um bom lutador caso tivesse começado a carreira 10 anos antes. E num combate que tinha tudo para ser movimentado, por um não temer jamais ser cortado e outro por não levar a carreira muito a sério, o que vimos foi uma briga por migalhas. Pareciam que estavam contando quem dava mais socos de raspão e torcendo para o número bater com a contagem dos árbitros laterais. Sem agressividade, sem tentativa de vitória, apenas ficaram ali. Os dois com tanto medo de perder uma coisa que nenhum deles realmente tem. Credibilidade.

Kongo venceu por pontos, mas não foi pra frente e Mitrione perdeu, mas não andou para trás. Uma luta estática e irrelevante entre dois atletas que se jamais lutassem de novo só iríamos perceber quando aparecessem, com 40 anos, no programa do David Letterman especial com ex lutadores.

Roy Nelson VS Mirko Crocop

Depois de aparecer mais gordo do que o normal, contra Frank Mir, e mal conseguir segurar a guarda alta sem respirar pela boca, Roy foi intimado por Dana White a perder peso. Aquela não era a forma e preparo físico de um atleta profissional, de acordo com ele. Concordamos. O interessante é ouvir o narrador americano Joe Rogan tentando nos convencer de que agora Roy estava em forma, submetido a um treinamento intenso e determinado a lutar pelo cinturão. Nelson não estava em forma nesse UFC 137, estava menos obeso. Diminuiu as chances de ter um micro enfarto fulminante no meio do octagon em 20%, e só começou a perder o gás no meio do primeiro round, quando antes perdia subindo os três degraus da escadinha que levam ao octagon. Roy Nelson não é atleta nem lutador. É um cara pesado, faixa preta de jiu-jitsu e que apanha sem reclamar.

Venceu Crocop e comemorou com sua característica cara de pau. Sem a menor vergonha, declarou aparentemente sem ironia, que havia vencido uma lenda e que era uma das vitórias mais importantes de sua carreira. Não acho bom para o MMA atletas que já fizeram tanto, como é o caso de Mirko, ser usado como boi de piranha para forjar uma subida de cartel de atletas mais novos e sem muito talento. Roy venceu o mesmo homem Mirko Crocop, que barbarizou o mundo anos atrás, mas não venceu o mesmo lutador. São coisas diferentes. E aparentemente, mídia e fãs parecem concordar com isso já que a luta pouco impacto teve em seu ranqueamento ou base de fãs. Uma combate contra Kongo seria apropriado, apesar de irrelevante.

As últimas quatro derrotas de Mirko foram por nocaute ou nocaute técnico. E isso sem contar o nocaute assombroso contra Napão. O que falta para esse homem perceber que sua carreira acabou? Quando um dos maiores trocadores de todos os tempos é nocauteado sequencialmente, é hora de deixar pra lá. Quando Sakuraba foi finalizado por Jason Miller, sua carreira chegou ao fim definitivo, apesar de ainda continuar lutando. Um zumbi do MMA. Esses caras do Pride não desistem, não querem parar. Isso é lindo. Que continuem, se desejarem. Mas é fato que por saúde ou razão, deveriam tomar outro caminho.

Crocop foi um dos maiores, mas hoje em dia, não é mais nada. Sua lenda, sua marca, vai ficar pra sempre. Seus chutes ainda não nocautear tanta gente em nossa imaginação, mas na vida real, no dia a dia duro que é o MMA de altíssimo nível, ele não tem mais espaço. Arrisco afirmar que poderia ser nocauteado por Struve ou Browne.

Donald Cerrone VS Dennis Siver

Deixo aqui a ausência de minhas palavras em protesto a colocação de um dos maiores lutadores do planeta no card preliminar por meros e rasteiros interesses comerciais.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

ANÁLISE: UFC 136 - Edgar VS Maynard 3


Num evento cheio de estrelas e lições de vida, vimos algumas brilharem ainda mais forte e outras começarem a apagar melancolicamente. José Aldo mostra mais uma vez porque mesmo sendo superstar do WEC e campeão do peso pena, nunca fez um evento principal do UFC, enquanto Edgar, que tantos acham não valer o cinturão que carrega, mais uma vez cala a boca dos críticos e de seu maior nêmesis na porrada. Maia mostra que de tanto treinar uma arte podemos acabar desaprendendo outra, Sonnen VS Stann dão uma amostra de porque casar luta entre amigos não é uma boa idéia e Guillard personifica a batida realidade de que prepotência adora dar rasteira de frente no talento. Diferentes lições numa agradável e pouco surpreendente noite de lutas.

Frankie Edgar VS Gray Maynard

Edgar pode nocautear o King Kong que ainda vão achar que deveria descer de peso porque é muito pequeno para a categoria que vem dominando. Opinião se torna tendenciosa quando nega fatos, e é claro que Frankie pode até descer de peso e continuar campeão por lá, mas até aparecer alguém que consiga tomar o cinturão que ele agarrou e não quer largar, afirmar que deveria ir para outra categoria é, no mínimo, estranho.

É fato que Edgar é pequeno para seu peso. Leve na balança e ainda com um percentual de gordura mais alto e com menos massa muscular que seus adversários. Maynard, Cerrone, Ben Henderson, Miller, Siver, Guillard e quase todos os atletas de ponta do peso leve tem menos gordura e mais músculos que o atual campeão. Mas que injustiça usar o que o qualifica como gênio, para tira-lo do posto. Incrível é quem faz o impossível, o improvável, e isso Edgar vem fazendo faz anos. Ai de mim se assistisse a suas lutas sem ver beleza num cara tão pequeno subjugar outros tão grandes e fortes. Como poderia amar artes marciais negligenciando a realidade básica e primeira da arte marcial, que é a técnica suplantando a força? Edgar é pura habilidade e coração. Um campeão genuíno e pequenino. Pequenino para nós, espectadores, porque para o recém nocauteado Maynard, que lhe aplicou dois espancamentos que não foram suficientes para fazê-lo desistir, deve ser gigante.

Maynard faz o que faz e pronto. Não tem poesia, não tem fantasia, purpurina ou show. Seu comprometimento com a violência aplicada com o único objetivo de vencer é o que faz ser tão temido. Florian, Diaz, Huerta, Miller e o próprio Edgar, já sentiram o peso de seu pragmatismo chato e eficaz. Entra pra ganhar, vaias ou aplausos não alteram seu processo. É quase robótico em sua execução de estratégia e foco. Entra para desmantelar aos poucos, se necessário, progressivamente desgastando e vencendo por querer mais do que o adversário. Por cortesia de seu excelente wrestling e dos músculos de sua lombar feitos de cabos de platina, luta aonde quer. Em pé ou no chão, nunca é escolha do outro. E se garante num queixo de pedra para desferir contra golpes duros e constantes, ou num anti-jiu-jitsu de kriptonita, para largar a mão no chão sem risco de ser finalizado. É assim que faz desde 2006 e é assim que vem dando certo. Não inventa, não progride, não muda, não dá errado. Gray é quase mecânico. E quase venceu Edgar nas duas vezes que disputou o cinturão. Quase.

O que pode consolar Gray Maynard? Que acontecimento apaga as cãibras das entranhas de ter o sonho escapulindo por entre os dedos duas vezes seguidas? Os torcedores do Botafogo sabem bem do que estou falando. Sentir os ossos do queixo e do orbital e da têmpora de seu adversário racharem contra seus punhos de ódio. E soco a soco que acabariam com qualquer um, ver seu sonho mais perto. E em cada queda de Edgar, ansiedade, e a cada levantada, aflição. E porque esse moleque não fica no chão? O que tem nele que não tem em mim? Nem eu agüentava essas porradas. E pensamentos assim foram nocauteando Maynard de dentro pra fora, seu corpo ainda não tinha se dado conta do que a alma já sentia. Edgar não era maior do que ele, mas era mais. E quanto mais batia e mais quebrava, menos o campeão agüentava e mais ressurgia. Um lutador infinito, um microcosmo.

Enquanto Edgar estiver caminhando a terra dos seres humanos, Maynard sentirá sua presença. Até o fim de seus dias. Quando andar no shopping, trepar com a esposa, brincar com seus filhos ou até, quem sabe, eventualmente ser campeão sobre outro lutador. Essa derrota ancorou seu espírito. Prepotentes não tem canino forte para mastigar carne de pescoço. Para Gray desceria doce um fundo gole de absinto com duas gotas de cianureto.

Edgar é um dos maiores da atualidade e pode ser bem mais do que isso. Sua falta de carisma só vai dificultar as coisas e fazer o show ser ainda mais emocionante para nós. Um herói relutante. Defendeu o cinturão três vezes e as três lutas foram revanches diretas. Nem a direção do UFC se conforma com ele ainda ser campeão. Venceu Penn e Maynard, dois dos atletas, até o momento, considerados os mais perigosos da categoria. Agora falamos do fantástico Ben Henderson (e com razão), de Cerrone e outros. Mas sempre haverá um novo que precisa ser batido, é da natureza do esporte. E até que Edgar perca, temos que engolir que ele é o favorito contra qualquer um.

Se é tão veloz carregando massa adicional lutando nesse peso e sabemos que quanto mais leve, mais rápido o atleta se torna, caso descesse para o galo, seria invisível. Edgar faz o incrível luta a luta. Não é só a apresentação de grande técnica e determinação, são exemplos comoventes de superação. Ver Edgar lutar me inspira a ser um homem melhor, uma pessoa mais correta, tentar mais uma vez onde falhei, me dar mais uma chance. Quando Frankie caiu quase nocauteado pela segunda vez, foi sangrado na segunda luta contra o mesmo adversário e, mais uma vez se levantou, se recusando a aceitar o que parecia ser o destino lhe metendo cara a dentro um roteiro pré escrito, rachou mas não quebrou, com os olhos lacrimejando de dor, continuou esquivando e levando e fazendo o que acreditava. Porque é só assim que corremos atrás de sonhos, só levando e agüentando chegamos lá. Quando minutos depois nocauteou Gray, se lançando num direto, seu corpo arrastado pelo peso certeiro de sua luva com uma tonelada de expectativas, seus pés fora do chão, toda a sua existência num só golpe, com força para transformar carvão em diamante, o seu maior oponente num corpo caído, eu abracei minha namorada. Feliz. Não torço para atletas em específico, e o sonho alcançado por Edgar veio as custas do despedaçado de outro, mas de alguma maneira, aquela vitória, naquele dia, daquele jeito, pareceu certa. Pareceu um exemplo de coisas boas. Uma lição de perseverança e esperança que tanto precisamos de tempos em tempos. Edgar reescreveu seu destino no UFC 136, e inspirou que tantos outros façam o mesmo.

Jose Aldo VS Kenny Florian

Aldo era um dínamo, uma usina nuclear comprimida dentro de pouco mais de 1,70 de altura, voraz, audaz, móvel, imprevisível, perigoso. E por mais que ainda seja um dos maiores lutadores do mundo, não é mais nada disso. Era tanto, que mesmo em sua pior fase, ainda é mais do que a maioria. Mais do que todos em seu peso, para ser exato. A crítica vem por querer ver um Aldo estelar, não apenas o melhor do peso. A evolução aparentemente constante daquele que poderia ser um dos maiores de todos os tempos, parece ter estancado. Assim, sem mais nem menos. Parou de repente.

Aldo era um atleta selvagem. Como ele conseguia manter a frieza de matador da máfia mesmo sob dificuldade e alto frenesi eram emocionantes. Como mesmo nos momentos mais caóticos seus finos braços não largavam as rédeas das técnicas refinadas aprendidas e doutrinadas por André Pederneiras. Era letal. Uma borboleta com asas de gilete. Era o Aldo do WEC. Fãs apenas do UFC devem até ter dificuldade em entender porque tanto se falava dele. Em mais uma performance burocrática e reticente, venceu sem convencer. Foi mais uma vez superior a seu segundo adversário no evento, mas nada mostrou de grandiosidade, genialidade ou ímpeto. Parece que o tanque está furado, alguma coisa não está como era antes. Difícil ser específico. Pode ser psicológico, a pressão de ter que ser uma estrela, quando antes ele apenas era. O corte de peso, levando em conta a possível subida de categoria, já o preparando para ser maior no dia a dia, entrar maior, se acostumar a lutar carregando mais massa muscular. Pode ser que apenas tenha tido dois dias ruins, acontece, Anderson teve alguns contra Maia, Cote e Thales. Quem sabe. O que dá para afirmar é que ele está lutando quadro a quadro. Se subir para o peso leve, tento que ficar ainda mais pesado, vai se metamorfosear numa tartaruga e ser chutado para fora do octagon por atletas bem maiores e rápidos do que ele. Toda a expectativa que o planeta tinha, inclusive eu, de vê-lo protagonizando combates antológicos no peso leve ara baseado em suas performances no WEC. Esse Aldo de agora, pelo seu próprio bem, deve permanecer no peso pena.

Florian, que alterna comentários extremamente positivos com declarações depressivas, afirmou após mais essa derrota numa luta por cinturão: “...tem lutadores que simplesmente não nasceram para ser campeões.” No mesmo bar aonde Gray vai tomar seu absinto, Florian poderia ir junto e pedir uma dose dupla. Até como comentarista de MMA, onde se sai muito bem, não vai conseguir tirar a vaga de Joe Rogan.
Florian é um lutador excelente, quando está bem, quando seu jogo encaixa, quando não amarela, é um atleta que domina bem várias áreas. Mas em lutas por título, metade dele fica em casa, ou a metade ruim vem junto, quem sabe. É um mistério. Mas é claro que no octagon está enfrentando seu adversário e ele próprio. E contra dois, só Jon Jones. Lutou mal, com mais medo de fracassar de novo, do que raça para vencer pela primeira vez. Nessa matemática do ego, saiu negativo novamente. Não aproveitou a lentidão de Aldo, não foi agressivo em pé nem quando o brasileiro parecia cansado para segurar a guarda alta, não atacou por baixo nem percebendo que o campeão estava ali apenas para segurar e nenhum golpe iria desferir. Deu uma lição de fraqueza, um passo a passo de como não alcançar seus ideais. Mesmo de bermuda, camisa e boné do patrocinador, seu espírito estava desnudado e o tamanho minúsculo de seus colhões ficou a mostra para quem quisesse ver. Florian ainda pode fazer excelentes lutas, se abrir mão do cinturão, mas seu ego maior do que a coragem deve fazê-lo repensar a decisão de continuar na carreira. Vai lutar o que falta para finalizar o contrato e não o veremos mais usando as mini luvas.

Aldo é mais do que vimos, tem que ser mais. Não é possível que tenha nos enganado tão bem no WEC. Hominick não é melhor que Faber. Um dos lutadores mais empolgantes e promissores parece um veterano desmotivado. Dizer que ele cair por cima de um assustado Florian, e não desferir um soco ou cotovelada faz parte da estratégia, é fazer vista grossa para problemas que podem se tornar mais graves depois. Hominick só queria ficar em pé e Florian entra sempre derrotado em lutas assim, mas seu próximo adversário, Chad Mendes, é de outra raça. O antigo Aldo, o que tanto defendi, aquele sobre o qual já tão bem escrevi, o paralisaria com uma joelhada voadora no meio da cara, entre os dois olhos e diretamente acima do nariz. O deixaria com a cara no chão e a bunda pra cima, enquanto gritaria e celebraria subindo na grade do octagon. Mas o novo Aldo será derrubado, sistematicamente, sem magia ou beleza, por um incansável e invicto Mendes, que sem vergonha na cara vencerá uma luta chata por pontos onde velocidade e ímpeto superarão lentidão e desmotivação.

Que Jose Aldo me prove errado, que o faroeste do caboclo toque mais uma vez no UFC Rio 2, que ele vença contundentemente e que os fãs digam que eu torço contra e não entendo nada. Não me importa. E me entregar como mártir se minhas palavras podem lhe devolver sangue aos olhos, não é por torcer por ele, mas sim pelo MMA show e incrível que ele tem como por em prática frente aos meus olhos crédulos, ao vivo, e Chad Mendes nunca conseguirá.

Chael Sonnen VS Brian Stann

Chael Sonnen esteve assombroso de tão perfeito e eficaz nesse UFC 136. Um atleta com essa objetividade, essa capacidade de derrubar com tanta velocidade, sem tempo pra pensar, e dominar com socos e transições no solo um competente Stann pode, realmente, impor real perigo a Anderson Silva. Mas a questão é se Sonnen e Stann realmente lutaram nesse UFC 136.

Sonnen e Stann são amigos. Quem acompanha MMA pela mídia internacional sabe a admiração e vínculo que une fortemente os dois. Não creio que houve armação, apesar de Sonnen adorar uma, mas por parte de Brian isso não aconteceria. Uma pessoa séria que reverte grande parte de tudo o que ganha com MMA para instituições que cuidam de ex soldados, companheiros de guerra que não tiveram a mesma sorte que ele, feridos em combate. Um homem com memória e gratidão é um homem de fibra. Quem não tem fibra, nunca vai entender essa frase. Stann tem. Homens assim não se vendem. O que parece ter acontecido é que ele não tinha a mesma motivação para lutar contra seu amigo. Por mais que seja um esporte, é violento. E não é qualquer indivíduo que consegue praticar violência contra um ente querido, mesmo que apenas esportivamente. Eu não entrava de sola no meu irmão quando jogávamos futebol. E foi isso. Stann não entrou de sola, não veio pra vencer. Veio pra cumprir um contrato como um bom profissional faz, pela grana, pelo show. Mas o desejo de superar o adversário, que em MMA vem com pequenas doses de raiva, agressividade e coisas assim que temperam o momento, ele deixou na prateleira da cozinha.

Apesar das boas performances recentes, Stann não é um grande lutador. Agressivo e displicente, tem uma carreira bem irregular. Sua derrota não foi surpreendente, ainda mais levando em conta que era claro não querer muito estar ali. Sonnen aproveitou, mas não maltratou. Fumou mas não tragou. Não é tão bom quanto pareceu ser, mas ainda é bom o suficiente para vencer Stann mesmo que lutassem a vera. Em qualquer situação normal desceria o cotovelo na cara, depois de 3 rounds por cima, e rasgaria Stann para mais de 20 pontos juntarem. Não fez isso. Sentiu o amigo amuado, dominou sem trauma e venceu convincentemente para quem olha com olhos inocentes. Levantou e clamou por Anderson Silva. Dana White que tem olhos de serpente, percebeu nessa uma vitória café com leite e agendou uma luta sua contra Munhoz. Outro lutador longe de ser realmente bom, mas um adversário que lutará de verdade.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

ANÁLISE: UFC 135 - Jones VS Jackson


Minhas zapeadas constantes no Rock in Rio durante a transmissão desse UFC 135 mostra que alguma coisa saiu muito errada. Vários tiros saindo por várias culatras. Card com Jones, Rampage, Gomi, Diaz, Hughes e Koscheck não render uma noite explosiva de lutas é como toneladas de dinamite sem detonador. Talvez o excesso de combates entre jovens atletas de ponta e estrelas em fim de carreira tenha sido a razão. A vitória de Ortiz sobre Bader foi emocionante simplesmente porque essas coisas não costumam acontecer, e sem contrariar nenhuma estatística, não aconteceram nesse UFC. Um evento estéril muito mais marcado pela apatia dos derrotados do que mérito dos vencedores.

Jon Jones VS Quinton Jackson

Quinton vinha de 10 vitórias em suas últimas 12 lutas. Em 6 anos apenas uma derrota controversa para Griffin e uma por pontos para Rashad e pronto. Rampage era um desafiante genuíno e bem credenciado ao título dos meio pesados. Para traçarmos uma linha comparativa, nos últimos 6 anos Wanderlei Silva perdeu 7 lutas. O que aconteceu com Jackson nesse UFC 135 é o que ainda vai acontecer com muitos atletas. Sucumbiu aos pés da aura de invencibilidade de Jon Jones. Perdeu a luta mesmo antes de entrar no octagon. Começou o round mais preocupado em não perder rápido e ser humilhado, do que partir para dentro e executar a estratégia e tentar ganhar.

Quinton declarou que Jon Jones não tem queixo, que tem medo de ser atingido no rosto. Que iria se meter por entre os socos do campeão até achá-lo e nocauteá-lo. Exaltou sua resistência, seu queixo, sua coragem de aceitar golpes para desferir um fatal, falou de seus momentos no Pride e o que separa os campeões eternos dos eventuais. Quase Don Quixote. No embate contra moinhos de vento saiu vencedor, mas na hora da luta nada disso aconteceu. Esteve apático, pequeno, obsoleto, tentando cruzados curtos sem o menor indício de sucesso e aceitando chutes na perna sem o menor esboço de defesa. Petrificou diante da medusa. Paralisou na luta porque parou no tempo. Seus cruzados funcionam com lutadores curtos que lutam por dentro, e funcionou tantas vezes, mas a chance de funcionar contra o segundo maior alcance do UFC era remota. Quando começamos a nos apoiar demais em improbabilidades e sortes para validar uma tática, é porque o objeto está longe do alcance racional. Quinton não tinha armas físicas ou técnicas para vencer Jones sem auxílio do acaso.

Chega um momento na carreira de um veterano que ele para de evoluir. Ele para de ser tornar cada vez mais perigoso porque para de aprender. Rampage, Wanderlei, Couture, Liddell, Hughes, Ortiz pararam de melhorar para apenas lutar. Apenas aparecer no octagon. Espertos aqueles que já se aposentaram antes de se machucar realmente. Como preparar uma estratégia contra Phil Davis, Rashad, Cerrone, Ben Henderson, Jones, se eles estão sempre se afiando, sempre em movimento? Dando passos além, sejam físicos, técnicos ou táticos. O mesmo não vale para a maioria dos veteranos. Basta pegar uma fita VHS surrada, colada com esparadrapo, que podemos montar uma estratégia para vencer Quinton Jackson sem surpresas. E foi isso que Jon Jones fez. Assistiu a todas as lutas do ex campeão, apesar de que poderia ter assistido apenas uma ou duas que daria no mesmo, e montou um plano de ataque sem falhas para uma luta aonde venceria mesmo sem plano nenhum.

Verdade que Jackson foi o que chegou mais perto de vencer o atual campeão e superstar Jones com uma chave de carisma no dia da pesagem. Conseguiu o impossível, fazer um dos lutadores mais queridos do planeta ser vaiado enquanto ele, o desafiante, saiu aplaudido. De foragido da polícia, quase mal caráter no TUF, desinteressado em continuar competindo em MMA para ser artista de cinema, até dar a volta por cima, disputar o cinturão e ser aclamado pelo público como herói. Coisa que só uma lenda do Pride poderia nos proporcionar. Mas foi só isso. Como tempos atrás Jackson conseguiu seu status de imortal dentro dos ringues e octagons, o mesmo vale até hoje. È lá que ouvimos o discurso que não precisa ser dito, a verdadeira história contada pelas luvas, no terreno aonde nasce o para sempre. E lá Jones vem construindo seu império com ossos e almas dos derrotados.

Jon Jones venceu sem dificuldade, quase como se não quisesse realmente machucar seu oponente e ex ídolo juvenil. Dominou completamente lutando pela metade, como vem sempre fazendo e parece que vai continuar durante muito tempo. É da beleza do MMA revigorarmos nossos interesses depois de uns dias e sempre acharmos que um novo desafiante, uma revanche, pode trazer mais emoção, algo de diferente. Faz parte do ciclo de adrenalina e expectativas que nos abastece, mas friamente, sob olhar clínico, cínico e sem paixão, ninguém no meio pesado pode oferecer algum perigo a Jones. E do mesmo modo que isso é incrível de presenciar, pode acabar se tornando bem chato.

Jones pode iluminar o caminho para uma nova era do MMA, ou ser o buraco negro que só destrói atleta após atleta até que nada sobre, nem emoção. Se liberar seu estilo, se entrar no modo turbo, se quiser ser incrível mais do que apenas vencedor, pode figurar entre os maiores de todos os tempos rapidamente. Mas se pensar como GSP, em se manter campeão destilando doses homeopáticas e precisas de técnica apenas quando necessário, vai se tornar imbatível e irrelevante. Caso opte por usar sua superioridade técnica e física para dominar sem emoção e vencer sem paixão, vai ser mais um daqueles campeões que não motiva. O cinturão vai estar com ele, vai ficar milionário e ter várias mulheres. Não nos enganemos, um possível desprezo não afetará nada disso. Mas no fundo de sua alma vai estar um buraquinho, um vazio, uma sensação perene de desconforto. A presença da ausência de nossos aplausos.

A carreira de Jones só começou e já achamos que ele tem que fazer mais do que apenas desmantelar Shogun e vencer com facilidade Jackson. Fazer o que? Culpa dele que nos mostrou traços de genialidade e fantástico e nos acostumou mal. Bones pode ser um lutador incrível de assistir, ídolo de nações inteiras, estrelar nossa new age, mudar a capa do livro do MMA, ou pode continuar sendo o que parece preferir, respeitado e temido, mas muito pouco querido.

Matt Hughes VS Josh Koscheck

Koscheck é top 10 do meio médio e Hughes é um veterano em fim de carreira que não figura nem no TOP 12. O casamento dessa luta não só foi desnecessário como foi desrespeitoso. Qualquer análise breve do cartel recente dos dois mostrava que era um estorvo e deveria ter sido evitada.

Após a derrota para Thiago Alves em 2008, Matt já dava claros sinais de queda física, performance, competitividade e anunciou que deveria se aposentar. Não via mais motivo para competir não fosse para figurar entre os melhores. Apenas uma luta conseguiu mudar sua idéia, uma suposta última luta contra o pseudo arqui-rival Matt Serra. A possibilidade de vingança colocou fogo em seus olhos novamente. Os dois se arranharam numa luta monótona e sem brilho onde venceu um Serra gordinho e desmotivado em 3 rounds de trocação de baixíssima qualidade. Revigorado pela vitória e com sonho de reconquistar o querido cinturão que repousou com méritos em sua cintura por tantos anos, resolveu voltar a ativa. Venceu Renzo que pode ser mestre em jiu-jitsu, mas atleta de MMA não era mais, e Cachorrão num resultado tão surpreendente que deveria tê-lo feito negar a revanche contra Penn. Quem é azarão contra Cachorrão vai ser pulverizado pelo fenômeno BJ. Quem acha que não, pagará o preço pela ignorância com células nervosas e Matt pagou. Ao colidir com o primeiro lutador realmente de ponta nos últimos 2 anos acabou pulverizado. Sorte que não estava ventando em Michigan ou nem as cinzas do ex campeão iam sobrar para colocar no jarro. A aposentadoria merecida foi soterrada pelo casamento de mais uma luta, dessa vez conta Koscheck (antes era Diego Sanchez), simplesmente veloz demais, forte demais, resistente demais atualmente para ter alguma chance de sair sem o machucar.

Matt que tem o coração maior que o queixo e que o bom senso entrou para definir e acabou nocauteado sem dificuldades. Não tivesse abençoado pelo excesso de respeito do adversário, teria dormido antes. Acabou com a cara no chão e a bunda pra cima. Um lutador lendário que já superou tantas adversidades e venceu tantos grandes atletas, merece lutar mais uma, mais uma, mais uma e mais quantas vezes achar de deve. É problema dele. Mas quem admira o esporte não acha agradável ver esse nível de derrota. Espatifado, tirado pra nada. Matt foi um dos maiores e, por respeito a si próprio, deveria parar ou aceitar lutas mais equivalentes apenas contra veteranos. Uma revanche contra Royce é uma idéia que me agrada. O que não me faz a cabeça é a organização do UFC canibalizar estrelas antigas para alimentar as jovens.

Koscheck venceu, mas não provou nada. Teve até mais dificuldades do que deveria. Deixou claro que o rombo em sua guarda que GSP expôs com jabs e cruzados de esquerda ainda está ali para quem quiser usar. Um buraco incorrigível, um abismo técnico que nunca vai conseguir atravessar para disputar o cinturão novamente. Não é vencendo um veterano em decadência que vai prosseguir na carreira. Deveria ter seguido o exemplo de Rashad Evans quando negou a luta que lhe foi oferecida contra Randy Couture: “não tenho coragem de bater num homem de 40 e poucos anos e depois dizer que quero disputar o cinturão”.

Nate Diaz VS Takanori Gomi

É de se lamentar que Gomi não tenha se provado contra as estrelas do UFC quando estava em seu auge, quando era um dos lutadores vai vorazes e violentos do planeta, freqüentador assíduo dos TOPs P4P e estrela de alguns dos maiores combates já testemunhados no esporte. Gomi contra Kawajiri, Pulver, Azeredo, Nick Diaz e Sakurai são inesquecíveis. Contribuição eterna e incandescente do fireball kid para o hall da memória que cada um de nós guarda dentro de si. Momentos que ajudaram a construir e ajudam a manter esse esporte. Quando presenciamos Browne, Struve e outros no octagon, é a lembrança de momentos como os de Gomi que nos faz tolerar e sempre acreditar que coisas melhores virão.

Gomi era invulnerável, feito de alguma liga impenetrável vinda lá da ásia, não sentia dor, não se machucava por mais que fosse atingido. Não caía, quase não bambeava, partia pra cima e trucidava. Durante alguns anos nenhuma estrela ofuscava o brilho da sua. Uma presença que causava temor e expectativa. Foi tanto em tão pouco tempo e depois não foi mais. Acendeu e apagou em segundos. Um dos maiores por apenas uma fagulha de tempo.

O Gomi que finalmente chegou ao UFC anos atrás já estava desativado. Não me perguntem porque. Lutava igual, partia para definir igual, tinha o mesmo coração, mas alguma coisa não estava lá. O sangue havia estancado. Fora um brilhareco contra Tyson Griffin, suas performances eram melancólicas e culminaram com um fiasco nas mãos de Nate Diaz.

O sonho de ver uma versão vintage de Gomi não poderia ter melhor condutor do que Diaz. Um lutador sem poder de nocaute, franzino, prepotente na trocação e ávido por sempre testar se o oponente agüenta mais porrada que ele. Grama seca perfeita para Gomi incinerar e voltar ao lugar que achamos ser seu por direito. Mas o que vimos foi o japonês sem precisão, sem resistência, tentando derrubar um Diaz que bateu como quis, derrubou com jab e fez parecer fácil. Takanori fez demais pelo MMA, mas acabou. It’s over. Antes eu torcia por uma luta entre ele e Melvin Gullard, mas essa performance me fez ficar contente de nunca ter acontecido ou no UFC 135 poderia estar assistindo do Japão, de cadeira de rodas.

Nate continua irregular. Capaz de fazer uma luta parelha contra o poderoso Gray Maynard, ser manipulado tipo massa de bolo pelo inexperiente Rory MacDonald e superar Gomi no boxe. A falta de padrão em suas lutas é o que o mantém sempre distante do topo. Um lutador emocionante, querido e odiado na mesma medida, capaz de vencer os melhores e ser derrotado por qualquer outro. Trabalho não faltará para Nate que sempre aparece e faz o melhor que pode, mas seu melhor nem sempre é proporcional a expectativa que gera. Sua cabeça de vento e displicência com tática e treinamento sempre vão mantê-lo longe do tão sonhado cinturão. Se é que ele sonha com isso.

Mark Hunt VS Ben Rothwell e Travis Browne VS Rob Broughton

Duas lutas que juntas não valem por uma, tão ruins e desprezíveis da mesma maneira que não poderia ser misericordioso ao mencionar só a outra. Nem teria porque escrever sobre apenas um se o texto valeria para os dois. Gêmeos siameses, deformados, uma versão distorcida e errada do que amamos. Um erro por parte da organização e ainda maior da minha que assisti até o final.

MMA não é mais vale tudo e nunca foi briga de bar. A diferença de um esporte de ponta e de uma competição é o esporte é praticado por atletas profissionais. E não há atleta que leve sua carreira e os fãs a sério e carregue 50Kg de barriga. Pode ser guerreiro, brigador, orgulhar a mãe e o bairro onde nasceu, mas não é atleta. Vimos 4 transeuntes do esporte, 4 obesos se esfregando durante um total de meia hora apenas por grana. Sem paixão por MMA, sem ambição, sem técnica. Qualquer faixa azul de jiu-jitsu, qualquer menino que treine wrestling ou boxe durante 1 ano faz melhor do que eles. Habilidades mal passadas, falta de resistência, apatia, incapacidade de finalizar o combate. Conterrâneo e Mondragon fariam frente a qualquer um desses e Lula Molusco já despontaria como franco favorito.

Salvo alguns caroços de técnica de trocação que sobraram na panela de Hunt, nada mais havia para saborear. Poderiam ir todos juntos com Roy Nelson para aqueles programas de emagrecimento. O primeiro que descesse para meio pesado ganhava um contrato de volta. E os outros, talvez a dignidade.

Dois dos piores momentos da história do MMA, no mesmo dia, seguidos. Um caminho de Santiago de Compostela sem garrafa de água, a trilha de Machu Picchu sem parar para pegar ar, a escadaria da Penha de joelhos. Quem assistiu até o final, de ponta a ponta, pode tanto se considerar realmente fã como aceitar sofrer de certo masoquismo.