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terça-feira, 5 de julho de 2011

ANÁLISE: UFC 132 - Cruz VS Faber


Ao fim de uma partida de futebol temos dois tipos de torcedor, o triste e o feliz. Essa simplicidade binária não acontece no MMA, esse esporte nos entope coração a baixo tristeza e alegria juntas, e que se dane. Glória e decepção, aplausos e vaias, ao mesmo tempo, aqui dentro de nós. É essa sensação complicada de descrever que o faz único. Grandes eventos são como mini epopéias, com heróis, vilões, fins e recomeços. Se quiséssemos mostrar para alguém que estava morando em Marte nos últimos 20 anos porque esse é o maior esporte já inventado, poderíamos selecionar vários eventos inesquecíveis e esse UFC 132 é um deles.

Dominick Cruz VS Urijah Faber

Faber foi um dos maiores atletas do mundo, independente de esporte. Rolou ladeira abaixo do peso pena esmagando quase todos que tentavam parar o giro de sua massa sólida de socos, quedas, voracidade e gametas masculinos, até que se espatifou em mil pedaços contra a canela de titânio de José Aldo. O superstar brasileiro mostrou que Faber tinha se tornado obsoleto e prepotente, dominava o peso que ainda carecia de um campeão genuíno, e não seria o californiano.

Faber rompeu a cápsula de isolamento aonde boiou durante os últimos anos e reinventou seu treino e corpo para o peso galo. Misteriosamente manteve força e ganhou velocidade. Na guerra por supremacia eterna entre lógica e sentimento que já estourou tantos morteiros dentro dele e arrasou tanto adversários quanto o próprio, o cérebro agora foi promovido a general. O coração veste a armadura e encara o que vier, mas não dá mais comandos. Faber entrou contra Cruz em seu melhor momento. Anteviu movimentos improváveis e por vezes foi mais rápido que a velocidade do som. Fez seu máximo e foi emocionante, mas apenas o suficiente para dar trabalho ao incompreensível Dominick Cruz.

Forço a memória e não lembro de ter assistido nenhuma luta ruim no peso galo. Atletas completos, bons em pé, por baixo, em quedas. Parece que todo mundo é mestre em tudo. Num peso aonde os competidores não tem como ser mais completos e cada vitória vem ao custo de muito suor, sangue ou a pontinha de um nariz na foto da linha de chegada, Cruz parece acabar a corrida antes do cérebro dos outros assimilar que o tímpano vibrou por conta do tiro de largada.

Cruz não se move como um humano normal. De terno em coletivas de imprensa, até nos engana, mas dentro do octagon, quando o instinto de sobrevivência é ativado o disfarce fica mais evidente. Atletas normais caminham, Cruz cai, cambaleia, dá passo atrás, inclina pra frente, pula e dá um soco que eu poderia jurar ser uma tentativa de queda. Quanto mais o adversário estuda as fitas de suas lutas e seus movimentos mais complicado fica, luta após luta, mais e mais variações, combinações improváveis, movimentos híbridos sem um contra ataque específico em nenhuma arte inventada desde a pré história. Cruz é a gaveta feita pra não abrir, pedra que voa, água que não molha. Ilógico e indecifrável. Se não fosse campeão seria apenas um excêntrico, mas sendo imbatível, é genial.

Luta muito parelha de um homem que forjou sua carreira com esforço, perseverança, trabalho e soldou com paixão, contra um inumano que, aparentemente sem esforço e com sorriso nos lábios, é naturalmente melhor que todos os outros.

Wanderlei Silva VS Chris Leben

Wanderlei vinha bradando o que faria quando encarasse Sonnen ou Belfort uma semana antes da luta contra Leben. Subestimar um adversário normalmente é conta paga em pedaços de dente e Wand pagou a sua em células nervosas, porque ninguém é impactado pelas luvas cheia de concreto do havaiano sem sofrer moderado dano cerebral.

Wanderlei está longe de seu auge, só quem começou a assistir MMA 5 anos atrás não sabe disso, mas parte da imprensa especializada afirmar que ele vem sendo sucessivamente nocauteado. Simplesmente não é verdade. Nos últimos 4 anos foi nocauteado 3 vezes. Por Dan Handerson, atual campeão do Strikeforce, ainda no auge em 2007, por Quinton Jackson em 2008, atual contender número 1 ao cinturão do peso mais disputado do UFC, e agora por Leben. Nesse ínterim protagonizou umas das lutas do século contra Chuck, perdeu numa decisão polêmica para o ainda excelente Franklyn e venceu Bisping e Jardine. Wanderlei já não é mais o mesmo, mas imprensa e fãs poderiam esperar um pouco antes de o empalharem e colocarem na prateleira.

Não afirmo que ele dará a volta por cima e essas tralhas despretensiosas de auto ajuda. Sua mente não é mais a mesma, seu instinto de trucidar não é mais o mesmo e, principalmente, seu corpo não é mais o mesmo. Francamente acho que merece optar por parar ou lutar mais uma vez e receber nossos aplausos, por tudo que já fez pelo esporte, em qualquer situação. Não sei contra quem deveria lutar, se optasse por isso. Um dos maiores deve cair contra os maiores, e quanto mais jovem e talentoso seu adversário menor a chance de uma gloriosa volta por cima. Um dilema que ele terá que resolver sozinho no tatame da academia, no treino, porque se a decisão for tomada num jantar cordial de família, o resultado no octagon vai ser o mesmo de hoje.

A clareza e sinceridade com que Leben encara seu papel coadjuvante no grande show do MMA o faz um personagem muito interessante. Só o que ele tem é um soco forte e uma cabeça bem dura, mas como MacGayver que transformava cabo de aço e chiclete em dinamite, Leben manufatura lutas altamente competitivas.

Luta rápida entre um atleta que ainda tem queixo para agüentar porradas e agüentou, e um que não pode levar mais nenhuma e levou. Só não vamos fatiar a realidade e achar que nunca foi realmente bom já que perdeu pra Leben. O americano fez bem o que foi pago para fazer, mas seria depenado e destroçado feito uma codorna por Wanderlei Silva no auge.

Tito Ortiz VS Ryan Bader

Eu não torço por atletas em específico, torço por boas lutas e confesso que queria ver Ortiz vencer essa. Não por ele, mas por mim. Ortiz é pedaço do que me fez amar MMA, como são Hughes, Minotauro, Wanderlei, Sakuraba, Fedor e etc. Peça que não pode faltar para o mistério ser desvendado. Quando jovem sempre torcia para ele perder, era o vilão dos combates, o bad boy, mas há um certo carinho por esses personagens em grandes histórias. Darth Vader, Coringa, Lex Luthor. Não haveria grandes heróis sem grandes vilões e Tito foi um dos primeiros antagonistas. O tempo passou, o esporte evoluiu em preparação física, mídia e etc. Os novos fãs trazem um desejo sedento por mais e mais lutas e canibalizam o passado para criar lendas instantâneas. Quando Cro Cop perde para Kongo, Fedor perde para Werdum, Minotauro perde para Mir, Wanderlei perde para Leben, tanta gente aponta o dedo como que descobrindo uma fraude nos livros de história. Uma lógica distorcida e ingrata que desmorona toda a beleza do nosso esporte com cuteladas de ignorância. Se Cro Cop perde para o limitado Kongo, então não foi nada demais a vitória por arm lock de Minotauro sobre o croata no Pride, coberto por aplausos de quase 100 mil pessoas? É uma teoria caótica de canibalização de mérito que deveria parar pelo bem de todos, mas parece estar na moda. Cro Cop, durante o período em que esteve no auge, foi o maior striker peso pesado que já andou pela terra, Minotauro foi o maior lutador de jiu-jitsu peso pesado que MMA já produziu e assim por diante. Ortiz não foi o maior em nada e ainda está decadente, mesmo assim foi mais do que suficiente para derrotar o TOP 10 moderno Ryan Bader.

Dana queria cortar Ortiz após sua derrota para Hamill alegando que não teria mais nível para competir com os melhores. Tito implorou por uma chance e encararia qualquer top do peso. Poderia ser sua última luta, o portão de desembarque estava logo ali, mas esses caras das antigas, esses que fazem parte da criação desse tal MMA, são feitos de outro material. Foram cunhados numa época mais violenta, menos asséptica. Não havia a mídia de hoje para nos convencer que um lutador é bom ou ruim, ou ganhava e seguia em frente ou era esquecido. Era uma terra cruel na qual caminharam os maiores. Tito optou pelo tudo ou nada, pelo êxtase máximo de superar todos os limites ou a cara na lona. Teve a coragem que Couture teve, que Fedor está tendo. Meio coragem, meio loucura, meio cara de pau. Quem sabe. A questão é que nesse UFC 132 Ortiz lutou pelo MMA clássico, sua vitória significou tanto pra ele e tão mais para o fã antigo. Bader é um dos melhores do mundo, não venham os chatos dizerem o oposto, e mesmo assim Tito o venceu. Poderia se aposentar agora, rico, dando entrevistas debochadas e acarinhado por aplausos e manto da glória. Mas não irá, como Couture não pararia se vencesse, como Wanderlei não quer parar e como Chuck só parou porque foi forçado. A maioria se aposentará com derrotas, só parará quando o corpo ruir, lendas não tem bom senso. Se tivessem, não as seriam. Devemos ter um certo carinho quando caírem mais uma vez, um respeito por ainda tentarem fazer o que faziam tão bem e gostávamos, por lutarem apenas por paixão aonde tantos lutam apenas por grana. E quando vencerem, aplaudir. Como eu aplaudi essa vitória de Tito Ortiz como nunca o havia aplaudido. Seu último ato foi o maior, no final o vilão salvou o filho e tirou a máscara. Uma gota de colírio para quem vem assistindo o esporte de óculos escuros. O MMA venceu Ryan Bader nesse UFC 132.

Melvin Guillard VS Shane Roller

Os lutadores do peso leve deveriam se esconder nas trincheiras porque as mãos de Guillard estão zunindo em todas as direções. Um jovem lutador com experiência de veterano, Melvin poderia ter se entregue ao roteiro óbvio que a vida parecia ter lhe reservado. Menino pobre, problemas com bandidagem, prisões, drogas, família, chances e mais chances desperdiçadas. Quantas histórias assim começam e acabam todo dia e não são dignas de nenhuma tirinha de jornal de bairro. Quantos Tysons, Jordans, Andersons, Pelés acabaram na marginalidade por simples falta de perseverança? É verdade que alguns tem caminhos mais fáceis que outros, grande mentira é de que todos somos iguais. Para alguns a vida é mais fácil, fato, a questão é o que fazer com a sua se for difícil.

Guillard largou esse passado pra lá e se agarrou em um dos fiapos de oportunidade que ondulavam por perto, talvez o último, e se internou na academia de Greg Jackson. Lá, em segredo, foram maquinando, redesenhando peça por peça, projetando o design capaz de encaixar o máximo de bombas, dinamites, scuds, teleguiados, granadas e outras armas de destruição em seus dois braços de 39 cm de circunferência por 5% de gordura. Dois dos equipamentos com mais capacidade de devastação acoplados a um lutador sofrido, sedento, violento e que sabe bem como operá-los.

Guillard ainda vai fazer muito mais do que já fez e Shane Roller vai continuar funcionando como bateria para boas lutas com sua entrega total ao combate, mas lhe faltará sempre o talento que separa os relevantes dos secundários.

Carlos Condit VS Dong Hyun Kim

Tantos grandes lutadores rapidamente começam a respingar derrotas em seu cartel e tantos outros medianos se mantém durante tanto tempo sem derrotas. Kim está longe de ser um mal lutador, porém mais distante ainda de ser o excelente atleta que seu cartel impecável denota. Condit carimbou com o joelho no meio da cara do koreano um ponto final nessa história cheia de meias verdades.

Condit estaria invicto desde 2006 com 13 vitórias seguidas não fosse a derrota extremamente controversa para Kampmann, que adora esquecer dessa luta quando faz discurso sobre ser sempre prejudicado pela arbitragem. Condit é um dos lutadores mais completos e empolgantes do planeta, ficou órfão de notoriedade quando a categoria aonde barbarizava foi extinta do antigo WEC. Um legítimo desafiante ao título que a máquina do UFC esqueceu de divulgar. Tantas bijuterias em caixa de jóia e as lutas de Condit passando despercebidas como diamante em saco de supermercado.

Kim fará algumas lutas duras no UFC mas acabará por ser cortado por falta de carisma e vitórias sobre adversários relevantes. Condit deverá dar trabalho para o vencedor de Pierre e Diaz.

Rafael dos Anjos VS Georges Sotiropoulos

Independente do vencedor não é um bom sinal quando dois dos maiores lutadores de chão do MMA transformam o que era para ser um épico na lona, numa competição de kickboxe. Dois mestres de jiu-jitsu partindo para a trocação até que “bingo”, um caiu e o outro venceu. Vitória do brasileiro, mas se fosse o oposto, ninguém reclamaria. Também, reclamar do que? Parece que lutadores de solo quando se encaram tentam fazer lutas ao redor dessa técnica, lembrem de Maia e Grove, Minotauro e Mir. Quase que se uma derrota em sua especialidade traumatizasse de tal maneira a progressão de carreira e marketing pessoal que optam por se encarar em campo neutro. Os dois com menos qualidade, menos chances reais de vencer por técnica aplicada com perfeição, mas uma paz armada num resultado estéril.

Rafael venceu, mas não subiu muito e Sotiropoulos perdeu e não caiu quase nada. Agora é torcer para os dois se encararem em Abu Dabi.

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CRÔNICA 14 - HISTÓRIA DE UMA LUVA (publicada na revista tatame 183)


Eu nasci apenas couro, como tantas outras, um pedaço meio sem cor, um mero material esperando ser alguma coisa. A maioria virou banco, sapato, chapéu e outros aparatos tão sem importância. Eu não. Eu virei luva. Não uma luva gorda de boxe, mas uma luva de MMA. Preta, lustrosa, aerodinâmica e com costuras reforçadas. Eu e meu par, junto com tantas outras esperamos nosso destino, penduradas e embaladas na fábrica. Sabíamos que seríamos especiais. É da nossa natureza estar presente em grandes momentos. Mal podíamos agüentar a ansiedade de ganhar o selo. Nosso nome. Alguns dias depois nós e algumas outras entramos numa prensa e fomos finalmente batizadas com o nome de UFC.

Foram meses num armário gigante separadas por tamanhos. As posicionadas na minha frente iam saindo, estava chegando a nossa hora. Mês que vem talvez. Nunca ficamos sabendo que fim tem aquelas que saem do armário, sabemos para onde elas vão, mas e depois? Me bateu esse medo quando éramos a próxima da fila. Estávamos sempre aqui, no escuro. Talvez fosse melhor termos sido feitas luva de motoqueiro, dizem que motoqueiros nunca trocam suas luvas mesmo depois de bem velhas. Mas em MMA? Estava aflita e com um incômodo nas dobras da costura, uma certa aflição nas micro ranhuras aonde a tinta impermeável nunca conseguia penetrar, até que a porta do armário abriu e nos pegaram.

Fomos desembaladas sem frescura num vestiário vazio. Reparei nuns tatames de encaixe no chão, aparadores, garrafas de água e a TV ligada na primeira luta preliminar quando um pessoal entrou. Eram varias pessoas falando coisas motivantes e eufóricas. Pareciam uma família ou amigos. No ombro de um deles um cinturão. Não acreditei. Eu e meu par seríamos as luvas de um campeão, o sonho de todas nós, a glória maior. De ordinárias e iguais seríamos imortalizadas em vídeo. Nesse momento Maurício Shogun Rua aparece na sala.

Sério e cordial, ele sorri e passa confiança para todos assim como passam para ele. Não está tenso, mas nós três sabemos o que está em jogo. Quando o cutman começa a atar suas mãos o rosto muda. Percebi. Tantos ajudaram e tantos mais estão torcendo, mas o atleta é a ponta da lança, é ele que fura e é o primeiro a quebrar. Entraria para lutar sozinho se não estivéssemos com ele.

Nós somos colocadas, firmes, separadas pela primeira vez desde nossa confecção, cada uma em uma mão. Apertadas, adesivadas, justas e juntas com ele até o final. Eu fiquei na mão do direto, do maior impacto e logo senti a pressão de estar num campeão. Comecei a estourar nas manoplas, fiquei tonta, mas me acostumei rápido. Se tivesse dentes eles estariam cerrados e eu adoraria ser mão para poder socar com uma luva como eu. Eu agüento, quero ver se o adversário vai agüentar. Ele vai quebrar em mim.

No ocagon Jon Jones nos venceu e tomou o cinturão. Não consegui estourar um soco nele, mas te digo que se pegasse ele ia cair. Eu sabia o que tinha aqui dentro. A mão do lutador é nosso coração. Mas da mesma maneira que o destino quis que eu fosse a luva de um campeão, quis que terminasse dessa maneira. Somos só coisas. O acaso é mais finito conosco. Voltamos derrotados para o vestiário.

Havia sangue em mim, mas não era do adversário. Lágrimas me molhavam e Shogun não só se recusava a nos remover como apoiava a cabeça em nós. Pode descansar. Depois de minutos de silêncio sufocante finalmente nos retirou e jogou num canto. Trocou de roupa, voltou a ser pessoa normal e se foi sem olhar pra trás. Nos abandonou. Eu entendo. Não há muitos outros destinos para luvas como nós. Mas fiquei triste mesmo assim. A luz se apagou.

Horas depois alguém da limpeza aparece, pega meu par, joga no lixo e me coloca dentro de sua blusa. Nunca mais nos vimos. Fui entregue a um menino que ficou tão feliz em me ver. Sua mão pequena flutuou dentro de mim. Me levou para o banheiro, lavou, secou e pendurou numa parede ao lado da foto de Shogun. E aqui ficarei para sempre compartilhando sem palavras do mesmo sonho de meu dono. Só um autógrafo em tinta prateada ou branca, com caneta especial para couro. Ele querendo que o campeão o conheça e eu querendo que se lembre de mim. Eu nasci couro, vivi luva e morrerei memória.

ANÁLISE: UFC 131 - Cigano VS Carwin


Uma névoa estranha pairou no ar desse explosivo UFC 131. Não densa para obscurecer a qualidade altíssima dos combates, mas suficiente para dar a impressão de que os resultados que ocorreram com justiça acabariam por acontecer de qualquer maneira. Quase que um baralho de cartas marcadas na manga do crupiê que não precisou ser usado. Maia e Nunes realmente perderam suas lutas, mas cada um teve o primeiro round de superioridade clara pontuado como vitória para o adversário. Os brasileiros realmente perderam dois dos três rounds, mas com a impressão de que fora um nocaute ou finalização, nada que fizessem alteraria o resultado da luta. Ou estavam tendenciosos em credenciar um lutador famoso a disputar o cinturão com José Aldo e proteger maior ídolo Filipino do MMA ou assisti X-Files demais na infância. Nesse UFC a verdade esteve tanto dentro quanto fora do octagon.

Cigano VS Shane Carwin

Carwin já provou que tem o queixo duro, mas a mão de Cigano é mais. Shane Carwin poderia ter tido uma carreira brilhante tivesse surgido na época de Mark Coleman ou começado a se dedicar mais cedo ao esporte. Engenheiro, pai e atleta nas horas vagas, tem uma força e coragem raros. Poucos atletas com filhos para criar se permitiriam apanhar como apanhou no primeiro round sem pedir clemência e tentar preservar alguns neurônios para reconhecer a família no dia seguinte.

MMA é tão psicológico quanto técnico e físico. Mestres como Anderson, Pierre, Fedor e um punhado de outros compreendem a magnitude das valências que compõem um grande atleta. Um olhar perdido na pesagem ou um striker tão temido quando Shane tentar derrubar Cigano logo de cara, pode mudar a voltagem da luta de 110 para 220. Carwin disse que sonhou com esse combate, ia ser o melhor de todos os tempos, estava empolgado em explodir contra alguém que não fosse fugir de seus socos e testar seu queixo, mas a primeira coisa que fez foi tentar levar o brasileiro para baixo. Claramente trocar com o puro sangue Cigano não pareceu tão empolgante quando trancaram os dois dentro da jaula. A única coisa que realmente conseguiu colocar no chão com seu excelente wrestling foi sua auto-estima. Acabou espancado no primeiro round que não foi interrompido simplesmente porque galáxia inteira queria uma luta muito mais grandiloquente do que um atleta de quatro levando golpes sem reagir.

Para Carwin a luta acabou no primeiro round. Os outros dois passou tentando impedir que saísse desse UFC 131 direto para a mesa de cirurgia de novo. Todo atleta tem um limite de socos que agüenta tomar até que não agüente tomar mais nenhum. Um número que vai regredindo com o passar dos anos. Chuck, Wanderlei, Minotauro e Sakuraba demoraram uns 10 anos de porradas até o seu timer chegar a zero, mas a sova que recebeu nesse evento o aproximou perigosamente dessa marca. Se tinha queixo de titânio, agora tem de concreto. Tirando da cabeça o sonho insólito de ser campeão peso pesado, ainda pode protagonizar lutas muito interessantes contra Browne, Mitrione ou Kongo.

Cigano é um dos três melhores strikers do MMA pesado atualmente, mas o lacre que o faz tão perigoso é o gatilho que falta para se tornar lendário. Cigano tem uma calma, controle e aplicação tática de campeão e isso neutraliza seu faro de sangue, seu instinto matador. Aonde Wanderlei só parava de atacar até o adversário estar em pedaços, Cigano para estrategicamente. Foi inteligente de sua parte poupar os ossos da mão ao longo dos últimos rounds da luta, não dar chance para o adversário já derrotado marcar um rendevour com a sorte, não se lesionar ou se desgastar mais do que o necessário. Cigano poderia ter triturado Carwin antes do fim, mas trocou a glória pelo resultado certo.

Respeito e tento ver beleza nos diferentes modos de se comportar no momento da luta, como cada grande atleta encontra modos diferentes de ser perigoso e Cigano é um dos mais letais do planeta. As lutas contra Nelson e Carwin tanto nos mostraram seu poder de destruição quanto seu controle quase sórdido sobre ele. Tem a caixa mas só come um bombom.

Um dos talentos mais unânimes da atualidade, Cigano parece achar que pode administrar perfeitamente sua carreira fora dos octagons como faz dentro ao se disvincular de seus empresários de longa data Joinha e Ed Soares, conseqüentemente sair da Black House e cessar os treinos com Anderson, Minotauro e etc. Mudar toda a trupe que o ajudou a chegar aonde está nas vésperas do momento máximo, da luta pelo cinturão, pode ter sido um xeque mate ao contrário. Enquanto Cigano estiver se readaptanto ao treinamento, sparrings e etc, Velasquez estará alicerçado pela mesma equipe que o conhece desde o começo. MMA é mais do que estratégia, lógica e prudência. Coração é o estabilizador de voltagem aonde tudo se encaixa. Enquanto Cigano parte o de gente que deveria ter sido para ele mais do que apenas empresários e parceiros de treino, Velasques tem o seu como maior arma.

Cain VS Cigano já tem uma página em branco reservada no arquivo das lutas do século.

Diego Nunes VS Kenny Florian

Florian não é melhor lutador que Diego, é apenas mais inteligente. Na verdade é a inteligência de Kenny que vem o mantendo competitivo num esporte aonde quase todos são maiores, mais fortes ou mais perigosos do que ele. Uma máquina de auto upgrade, Florian prefere abastecer seu HD com dados dos adversários do que aprimoramentos técnicos. Arquiva mais estratégias e pontos fracos, do que novos golpes ou movimentos. Estuda mais o que fazer para vencer do que aumenta o arsenal.

Em sua primeira luta no peso pena, Florian que era David nos leves virou Golias. Enorme e longo para a categoria venceu o talentoso e perseverante Nunes por experience-lock. Enquanto o americano sabia exatamente o que fazer, o brasileiro parecia ir decidindo no meio do caminho. Improvisar com eficácia é qualidade dos gênios, e por mais que Nunes seja excelente, não tem terra nesse latifúndio. Florian foi suplantado pelo excesso de coragem e fé de Diego no primeiro round e virou a luta com pragmatismo quase matemático nos outros.

Diego perdeu com brios e sangue para um astro do MMA mundial, mostrou que ainda é TOP 5 no peso e manteve a tradição de grandes lutas do clã Pederneiras. Florian pode ver seu sonho de se tornar campeão virar pesadelo ao ser fatiado pelas vingativas canelas de katana de Aldo.

Kenny Florian VS José Aldo será Kill Bill total.

Demian Maia VS Mark Munoz

Sem a menor vergonha Maia vai trocando suas peles em constante metamorfose frente as câmeras para todo o planeta ver, de UFC em UFC. São estou certo de que me agrada o tipo de criatura que está se tornando, mas é bem divertido assistir. Quando um dos melhores lutadores de jiu-jitsu em MMA, talvez o melhor, resolve virar striker e passar horas e horas lapidando sua trocação, me parece o marido que resolve trair a mulher depois de 40 anos de casado. Mesmo assim o que Maia fez no primeiro round contra Munoz foi assombroso. Qualidade de movimento, precisão, volúpia que anda em falta em muita gente que diz adorar trocação. Deve ter voltado para o corner imaginando que se estivesse tão afiado assim contra Anderson o resultado da luta seria diferente. Seria sim, teria se exposto e acabaria nocauteado. A arte que aprendemos primeiro nos marca, deixa código de barras em cada molécula. Por mais que aprendamos outras com o tempo, são complementares. Planetas ao redor do sol. E por mais que Maia esteja evoluindo demais, jamais será um grande trocador. Pode no máximo ser o melhor trocador dos atletas oriundos do jiu-jitsu. Há alguma coisa diferente em quem treina em pé desde pequeno. O jeito de bater, apanhar, a adrenalina do constante rasante de luvas balançando a orelha, o prazer em atacar, chocar. Maia não tem isso e perdeu os outros dois rounds tentando manter a luta em pé e quando conseguia, não era eficaz. Não é essa a sua natureza. Só temo que acabe como o português que se mudou para a Alemanha, não aprendeu alemão, esqueceu português e acabou mudo. Demian perder uma pegada de costas com menos ajuste do que um faixa azul me faz crer que ele está jogando o jiu-jitsu para fora de casa e entulhando as gavetas com jabs e diretos.

Maia tem que terminar logo essa mudança, tomar uma decisão e seguir em frente, quase uma escolha de Sophia, o que nunca conseguirá é virar Anderson Silva.

O que vemos do Munoz em cada luta é tudo o que ele é. Não tem mistério, mensagem subliminar ou armas secretas. Ele aceita a trocação e se não der, derruba e larga a mão. Pronto. Nada mais, nada menos. Um lutador como tantos, relevante demais para seu país, irrelevante para os outros. Munoz não é bom o suficiente para enfilerar vitórias importantes ao ponto de disputar o cinturão nem ruim o bastante para sair perdendo e ser cortado. Sua importância no UFC será proporcional a sua relevância junto aos torcedores filipinos. Perdeu claramente o primeiro round e venceu por pouco os outros numa luta bem movimentada aonde os dois precisavam demais da vitória para não irem parar no card preliminar.

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ANÁLISE: UFC 130 - Jackson VS Hamill


UFC árido, um deserto de qualidades pelo qual nos arrastamos por horas a espera de um copo d’água, um oásis ao final, Edgar VS Maynard apareceram na linha do horizonte, mas apenas como miragem. Morrermos secos, com a cara na areia de um dos eventos mais chatos do ano. A luta principal de um card é mais do que a última, mais do que a mais importante, normalmente todo o planejamento, divulgações, casamento de combates e escolha de atletas orbita ao seu redor. A mudança de um main event tende a alterar todo o tom do evento e esse UFC 130 é um dos melhores exemplos de que da qualidade do matchmaking depende a falência ou sucesso de uma organização. Rampage e Hamill jamais poderiam estrelar um UFC atualmente, não os dois juntos pelo menos, mas se temos que isentar a organização de culpa já que os protagonistas originais se lesionaram é também verdade que não foi uma noite muito inspirada, nem por parte da maioria dos atletas nem por parte dos seus organizadores ao casar os combates. Um evento morno e econômico na emoção que me lembrou os tempos de quando a Zuffa acabara de adquirir os direitos de um UFC quase falido.

Quinton Jackson VS Matt Hamill

A máquina midiática do UFC tem um poder de manipulação de realidades impressionante. Desde convencer a maioria dos fãs que Rampage estava acabado e em fim de carreira após ter aberto mão da luta contra Rashad para divulgar o filme Esquadrão Classe A, até massificar que Matt Hamill é um grande atleta postulante ao cinturão. Realidade é que Quinton Jackson só perdeu duas lutas desde que estreou no UFC, uma bem controversa para Griffin e uma bem equivalente com o ex campeão e nêmeses Evans, e venceu Dan Handerson, atual campeão do Strikeforce, Lyoto Machida, Chuck Liddell, ainda no auge, entre outros. Quando parecia que abandonaria a carreira de lutador para seguir a de ator, Dana White fez o que adora fazer, convencer a todos de que quem não luta do no UFC não presta. Hamill, que tem uma história de vida e superação incríveis e é de grande importância para o MMA como esporte de cunho social, não passa de um mediano. Um nocaute para Franklyn que estreava no meio pesado, um espancamento nas mãos de Jones, uma vitória apertada sobre o decadente Jardine e uma luta sem nenhuma inspiração contra seu ex mentor e fora de forma Tito Ortiz, o colocaram como candidato ao título.

Não importa o que a mídia influenciada pelo UFC escreve, o que a revista do UFC publica. Quem é bom mostra dentro do octagon. E nesse UFC 130 vimos um main event sem a menor inspiração entre Quinton que ainda é um dos TOPs do mundo, apesar de longe de seu auge, e Hamill que nem com muita panfletagem pode figurar no top 20.

Acho de péssimo tom quando lutadores perdem a luta e dizem que estavam contundidos, com alguma giárdia ou etc. Se optou lutar, lute, perca e acabou. A desculpa não só obscurece parte do brilho do combate como tenta desmerecer a vitória do oponente, mas quando quem alega lesão é o vencedor, tendo a ser mais complacente. Quinton afirmou lutar com a mão quebrada. Se for verdade ele tem fibra de alumínio no lugar dos tendões e ainda dará muito trabalho para muito atleta novo, caso contrário, vimos que apesar de estar muito acima de seu adversário e da maioria dos postulantes, está a uma dimensão e meia de distância do campeão Jon Jones a quem será oferendado na próxima luta pelo cintirão meio pesado.

Uma luta chata, precavida, entre um Rampage comedido porém muito mais consciente do pouco que queria fazer, contra um adversário que não parecia estar ouvindo nenhuma instrução de seus treinadores, sem trocadilho. Andar de bicicleta e lutar MMA, quem sabe não esquece. Pode melhorar com o tempo ou piorar com a idade, mas o talento adquirido fica ali, nem que sejam pequenos resíduos. E quem não sabe não vai aprender apanhando de quem é melhor. Quinton simplesmente é melhor em tudo que Hamill. Em wrestling amador Matt é muito mais condecorado, mas MMA é outra criatura. Lembrem de como Jones, bem inferior em sua carreira de wrestler, derrubou com facilidade dois super medalhistas no esporte Hamill e Bader.

Hamill só tinha alguma chance real na forte divulgação do evento, é assim mesmo, faz parte, mas o fã experiente precisa diferenciar bala Halls de naftalina para não assistir a uma luta dessas e ficar decepcionado esperando um clássico dos tempos modernos.

Quinton vai engolir vergalhões de aço com parafusos contra Jones, mas a mesma máquina que tentou nos convencer de que ele estava acabado anos atrás agora fará o contrário. E Hamill vai fazer alguma luta irrelevante para o peso, fãs e mídia, já que o UFC não vai coloca-lo em um Countdown tão breve.

Frank Mir VS Roy Nelson

Olhando para Mir e Nelson temos dois exemplos de que podemos alcançar o fiasco por caminhos bem diferentes. Um está no auge de sua forma física faz uns anos, tornou-se atleta dedicado depois de superar a depressão pós acidente que quase amputou sua perna, o outro adora um Whooper do Burger King, acha engraçado vencer lutas em alto nível e ser um bom faixa preta de jiu-jitsu mesmo sendo obeso. Mesmo assim os dois se tornaram atletas lentos e previsíveis, sem gás ou real desejo de vitória. Um veio da loja de doces, o outro da academia e marcaram um encontro na casa da tartaruga.

Mir é enorme, um dos maiores lutadores do MMA atual, mas tem o coração do tamanho de um caroço de feijão. Biológicamente parece que o coração não consegue bombear sangue para tanto músculo, filosoficamente parece frouxo mesmo. Reparem que a tatuagem de dragão que começou a fazer tem anos, nunca terminou. Quando dói deve dar 3 tapinhas e pedir pra voltar no mês que vem. De uma forma ou outra ele adora oprimir seus adversários, bater e quebrar braços ou pernas com algumas das chaves mais violentas do esporte, mas não pode receber um jab de leve que começa a repensar a carreira e achar que todo o esforço foi em vão. Costuma acabar no chão, apagado e sangrando, pronto para fazer discurso de campeão e de retorno glorioso no dia seguinte. Só que Roy Nelson não acertou um peteleco em Mir, que ficou livre para fazer o que melhor faz, andar pra frente e lutar sem ser pressionado. Foram 3 rounds do ex campeão derrubando e tendo dificuldades de manter no chão o adversário. Apenas isso. Muito pouco até para estreantes em MMA no Amazon Fight, imagine para candidato ao cinturão do peso pesado no UFC. Essa vitória sobre Nelson somada a outra contra Cro Cop são duas no Sherdog, mas valem meio no meu caderninho moral. Mir está em decadência, apesar de seu bronzeado e discurso apontarem para o contrário.

Roy Nelson apanha com chantilly. Deve ser um lutadores mais prazerosos de se espancar. Não sangra muito, então não cria nenhuma sensação de culpa ou maldade, não cai, então pode apanhar mais, e no final está sempre rindo parecendo que gostou. Nelson não pode lutar em alto nível. Quem tem um mínimo de conhecimento de preparação física sabe que Nelson só não perde aquela barriga porque tem alimentação de obeso completamente desproporcional para uma pessoa saudável, imagine atleta, ou tem um tumor embotado que a Comissão Athlética não consegue diagnosticar. Se perder toda a barriga ele desce para peso médio e ainda será parrudo. MMA de alto nível não é agüentar ser espancado e não cair, é ter desempenho, é oferecer perigo, ser competitivo. Isso ele não é. Vercer Schaub e Struve foi o máximo que conseguiu e com uma luta contra Mitrione se desenhando, sua carreira no UFC está com a data de validade impressa. Vai ter mais tempo para assistir aos eventos de casa comendo pipoca e tomando coca-cola ao invés de estar competindo. E, francamente, acho que vai até preferir.

Tiago Alves VS Rick Story

Incrível o que paixão faz conosco. Como esse esporte embaralha nossa percepção de tanto que gostamos dele. Como explicar Story passar de quase desconhecido e azarão para ser considerado um dos melhores do mundo e super talentoso apenas por vencer Tiago Alves como outros tantos já venceram? Nem o alquimista realizaria tal transmutação com tamanha velocidade.

Tiago é vibrante, carismático, potente, mas não gosta de MMA. Seu sonho é ser contratado pelo K1 ou ter alguma cláusula nos eventos do UFC que forcem seus adversários a aceitarem a troçarão com ele. Um campeão como Pierre contamina o esporte e mostra que para ser campeão basta ganhar, não importa como, e muitos estão segundo isso. Quantos mais admiram Pierre, menos aceitarão lutas emocionantes e corajosas. Quem poderia aceitar uma troca clara com Tiago hoje em dia? Dan hardy e poucos outros. Mesmo assim, em MMA profissional, o fantástico é imposto na marra e Tiago não anda conseguindo fazer nada de relevante com seus adversários. Estagnou no muay thai que já é excelente e sublimou todo o resto. Qualquer lutador com um talento razoável em wrestling pode vencer o brasileiro sem grandes dificuldades. Em defesa de queda, Tiago ainda está no prézinho e dali não quer sair. Verdade que em certo momento, com as costas na grade, desferiu uma joelhada alta, em um contragolpe belo e letal demais, na distância do jab, quase colado, o joelho subiu e zuniu rente ao queixo de Story. Se pega a história do universo seria diferente e ele teria voltado ao topo da categoria, mas de “se em se” o Botafogo já foi até campeão do mundo. Fato que não pegou e Tiago está se mostrando um lutador não apenas unidimensional, mas obsoleto.

Rick Story é daqueles lutadores que aparece vez em quando e sempre lamentamos quando acontece. Um wrestler sem inspiração, com um boxe mediano, mas muito condicionamento físico e um queixo de adamantium. Não dá para derrubar na porrada, não dá para derrubar em quedas, mas ele também não faz muita coisa com essa vantagem técnica e suas lutas tendem a ser parelhas e os resultados questionáveis. Quase nunca realmente vence ou realmente perde. Quase sempre o justo seria empate. Uma luta entre Story e Pierre seria a primeira disputa de cinturão que eu pediria para me acordarem no quinto round.

Story venceu por pouco como sempre, mas venceu. Derrubou alguma vezes, caminhou pra frente e disfarçou bem não ter sentido alguns socos precisos de Tiago. Ganhou porque fez mais coisas, foi menos passivo. Nem um pouco brilhante ou especial, apenas mais ativo. E Tiago tem que parar de acabar lutas aonde realmente perdeu e levantar os braços ou fazer cara de surpreso. È constrangedor. Se ele realmente acha que venceu essa luta com o pouco que fez, deve achar que merecia pelo menos um empate com Georges St.Pierre.

Tiago merece ser casado com alguém com coragem de trocar em pé. Nem toda luta de MMA tem que ser entre atletas que vão disputar o cinturão. Acima da relevância do combate, tem a emoção. Alves pode ainda ser muito útil para o esporte se a organização do UFC o tratar com mais carinho, porque se depender dele próprio, não oferecerá muito mais.

Story é apenas um esforçado e suas próximas lutas provarão isso. Apenas esforço e preparo são cabos muito finos para sustentarem uma carreira sem talento. O americano voltará a ser lutador de meio de evento em um ano.

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ANÁLISE: UFC 129 - Pierre VS Shields


O UFC 129 teria sido um dos melhores eventos do ano, mágico e violento, não fosse pela participação de um homem, um atleta em específico, mas longe de atleta qualquer. A noite não foi espetacular porque um dos maiores campeões de todos os tempos mais uma vez roubou o show e escondeu em algum canto escuro, porque quando desliguei a TV havia uma sensação de insatisfação estranha que Lyoto, Couture, Hominick e Aldo não mereciam. Culpa de Georges St.Pierre. Um evento menos sobre vitorias ou derrotas e mais sobre renascimentos.

Georges St.Pierre VS Jake Shields

A maior arma de Jake Shields nunca foi seu fantástico jiu-jitsu ou disposição para espremer o corpo até do bagaço sair uma gota de vitória, era na verdade uma espécie de super poder capaz de atrair o adversário para um mundo em câmera lenta. Ganhando ou perdendo as lutas de Shields parecem devagar, socos que causariam dano em qualquer situação, nem deixam marca. Revejam Jake VS Miller ou Handerson, mas é uma arma quase sempre eficaz. Como fugir de um dos maiores finalizadores do planeta, um cara que antevê 2, 3 movimentos de solo que a maioria nem compreende e ainda em slow motion? Nesse UFC 129 Pierre fez a segunda coisa que faz melhor, fazer seus oponentes parecerem amadores desativando sua maior característica, fechando a válvula principal. Pierre forçou Shield a lutar em velocidade normal e o que era para ser um épico do MMA se transformou em mais um show de repetição e acerto do campeão.

Normalmente uma luva é recheada de ossos carpiais, metacarpiais, falange proximal e etc. Substâncias que dão peso a estrutura da mão e com boa aceleração, impacto ao soco. A luva de Shields é diferente. É recheada de algodão doce e zero aceleração. Fato que em pé não teria muitas chances contra um atleta explosivo e disciplinado pela cruel precisão de Freddie Roach. Mesmo assim Shields, que teria sua única chance real no solo, seguiu a risca a estranha e inapropriada estratégia traçada por seu treinador, Cesar Gracie, de manter a luta em pé. O próprio atleta aparentemente desmotivado com as diretrizes de seu comandante, mas como bom soldado se mantendo fiel, insistia em perguntar “posso tentar derrubar agora”. E ouvia um “ainda não” preciso e taciturno que cada vez mais o empurrava para o único lugar aonde não queria estar. Lembro dos meus tempos de menino freqüentando a praia do Pepê, de pé, de sunga vermelha, olhando impávido para o horizonte ensolarado, quando um senhor de aparentes 80 anos me perguntou se podia entrar no mar que se encontrava ferozmente revolto. Eu, não percebendo que me confundia com um guarda vidas, disse com a precisão de Cesar Gracie um frio “claro”. O senhor sumiu por entre as águas para jamais voltar no que foi, provavelmente, seu último encontro com Iemanjá. Shields ainda terá quantas lutas de MMA quiser porque é um dos melhores do mundo e merece, mas de ter confiado plenamente em quem o empurrou para a derrota certa, provavelmente nunca esquecerá.

St.Pierre é um dos melhores lutadores de todos os tempos, mas fato que bem mais cansativo do que toda a imprensa parecer sem coragem de dizer o contrário, é assistir suas lutas atualmente. Do primeiro ao quinto round, como cronista, acorrentado pelas correntes da ética a poltrona. Que inveja de quem pode ir até a cozinha, fazer uma pipoca e voltar na metade. O hábito tende a matar o prazer e Pierre entra para lutar enfastiado de tantas vitórias e elogios e fotos e autógrafos. Um olhar sem brilho e sem a determinação de antes. Sem fome, sem desejo ou paixão. Pierre reduz genialmente todas as milhões de possibilidades de um combate a um movimento, um ataque. Venceu Koscheck com jabs, apenas jabs. Porque fazer qualquer outra coisa se jabs eram suficientes? Venceu Hardy e Alves apenas com quedas. Para que tentar nocautear, realmente finalizar, mostrar que sua faixa não voltaria meio cinza da lavanderia? Para dar show, para ser mais do que melhor, se tornar um dos maiores, por respeito ao fã, por amor ao esporte que ele pratica, pelo legado que os grandes atletas deixam para as novas gerações e tantos outros motivos justos que cada um de nós teria. Nenhum deles tem grande valor para Pierre que entra, vence e vai embora. E esse combate do UFC 129 que tinha todos os ingredientes para ser emocionante ou apenas mais uma vitória tranqüila penetrada por uma das mil brechas na guarda de boxe de Shields, acabou sendo um bocadinho diferente.

A coisa que Pierre faz melhor hoje em dia é projetar com a ajuda de alguns dos maiores treinadores do planeta, um design para transformar qualquer combate num tédio completo. Tira o videogame da tomada na última fase. Essa luta não fugiu disso, mas como um marido que esqueceu que sua esposa é linda e a deixa ir de shortinho para a academia, Pierre vem se tornando desprevenido. Despreparado para o azar. Culpa de seu talento e culpa de seus adversários, não encontraremos inocentes. Em sua memória longínqua do que era ser um atleta de MMA está em algum compartimento a realidade de que seu domínio sobre os adversários e status de campeão vinha por sua ferocidade e coragem, e não por lutar de modo precavido e quase medroso. Podemos criticar, mas nada teria mais impacto do que o soco de Shields que arranhou sua córnea. Um soquinho de nada, mixuruca, que o desestabilizou e colocou em quase pânico. Castelo de cartas pode cair com uma janela aberta na hora errada. Naquele momento, quando temeu por ficar cego e derevria por coragem e precaução levar a luta para o solo, não conseguiu. Se manteve pregado, congelado na carbonita do plano, sem capacidade de improvisação, sem colhoes para mudar o eixo da luta. Fazer o que ele sempre fez tão bem. Naquela hora, naqueles longos 3 rounds que faltavam, ele sentiu que seu calabouço estratégico de onde seus adversários não conseguem sair, na verdade, tem ele, Pierre, como o grande prisioneiro. Lançado a uma solitária, sem magia e inspiração. Aguardando a morte lenta esportiva, dolorida de ter um cinturão de ouro que não brilha, lembrança do que já fez e não consegue mais.

Pierre virá mudado para a luta contra Nick Diaz. E ele apanhará como nunca apanhou ou vai ter que vencer em pé um adversário melhor que ele em boxe ou realmente faixa preta no chão. Vitorioso ou derrotado sairá ensangüentado, mas independente do resultado, renascerá.

José Aldo VS Mark Hominick

Nenhum atleta concentra mais força e agressividade por centímetro de músculo que José Aldo, mas ele estava diferente nesse UFC 129. Pode ser a readaptação já que vinha de lesão, o nervosismo de estrear como superstar no maior evento do planeta ou um resfriado mesmo. Não é mistério de Agatha Christie. É apenas uma pena. Aldo é mais forte, veloz, resistente e tático do que vimos. Mesmo assim foi suficiente para espancar o excelente quase desconhecido da maioria, Mark Hominick. O fim arrastado da luta, a dificuldade de Aldo no último round e a decisão por pontos dá uma falsa impressão de equivalência no combate, mas foi a capacidade inumana de absorver dano, agüentar dor, perseverar e um coração do tamanho do Canadá que fizeram o adversário se agüentar em pé até o final. Fosse Faber, Gamburyan ou quase qualquer outro, teria saido do octagon na maca.

Estrear contra um desconhecido grande lutador é uma missão inglória. Vai ser difícil vencer e a vitória vai chamar muito mais a atenção dos ranhetas do que dos fãs. Uma vitória sólida sobre um dos melhores lutadores da categoria, mas que será lembrada muito mais pelo valor do derrotado do que pelo esforço do campeão.

Homnick é um dos melhores trocadores do MMA e parece não sentir dor. Quando toma um knockdown nunca está desacordado, não há mudança em sua expressão, não range nem os dentes. Não há desistência. È um dos maiores adeptos da filosofia de BJ penn de que: “homens de verdade não desistem de uma luta por socos”. Para cessar o ímpeto infernal de Hominick de continuar e continuar, quase que abastecido pelo sangue que vai perdendo, só quebrando algum membro ou desligando suas sinapses nervosas. Um excelente atleta que vem dando shows em MMA faz anos e teve em seu maior palco sua derrota mais doída. Hominick entrou como desconhecido, sucumbiu frente ao brilho de um campeão genuíno e renasceu para os fãs como um dos maiores lutadores da atualidade.

Lyoto Machida VS Randy Couture

Randy Couture afirmou antes da luta que iria se aposentar de sua maneira, quando achasse que era o momento certo, diferente de Chuck que foi aposentado pela realidade de que ou abandonava a idéia de enfrentar lutadores tops ou sua vida poderia abandoná-lo dentro do octagon. Posso estar fazendo uso de picardia indelicada com uma lenda, mas tenho minhas dúvidas de que tinha planejado se aposentar com um dente a menos em uma de suas performances mais melancólicas.

Couture é uma lenda. Sua importância para o MMA só será realmente sentida daqui a alguns anos. Um ídolo genuíno, um competidor de verdade e um dos campeões mais emblemáticos. Um dos primeiros, junto com Fedor, Vanderlei, Sakuraba e poucos outros a ser querido por fãs do mundo todo. Uma lenda é indestrutível, uma vez criada, fica marcada na história da humanidade, tipo cicatriz, tatuagem, em livros, memórias. Não sai mais. Eterno como lenda, acabado como atleta de ponta. Um excelente wrestler que resolveu virar boxer, um pioneiro em estratégia de luta que se tornou um brigador, um atleta consciente de seus limites que se tornou prepotente. Couture involuiu. Atrofiou. Pediu para lutar contra Lyoto, seria seu canto do cisne, escolheu a dedo pegar um dos lutadores mais enigmáticos de todos os tempos alegando saber como enfrentá-lo. O que vimos foi apenas um lutador antigo, sem precisão, tentando imitar muito mal a estratégia usada por Quinton Jackson. Acabou nocauteado e banguela, um dos piores destinos, mas ao longo dos poucos minutos de luta ele não parecia ter como reescrever um fim de história muito diferente.

È uma pena ver o fim da carreira dos maiores, parece que pedaços do que nos construiu como fã de MMA vai ficando pra trás, mas se era para ele acabar caindo, se sua última luta seria uma derrota, não poderia o destino ter sido mais generoso conosco do que esculpi-la com a faca do pé de Lyoto Machida.

Sobre os maiores a marreta da expectativa desce mais pesada e Lyoto vinha tendo que absorver duros golpes da mídia, fãs e organização do UFC. Sua performance atrapalhada contra Shogun e a falta de objetividade contra Rampage o colocaram numa situação complicada. Estaria ele fazendo o que sempre fez, só que decodificado, ou estaria lutando mal mesmo? Teria ele um estilo tão preciso que não permite excessos? A questão é que Couture foi oferecido a Lyoto como boi de piranha. Se ele não vencesse um lutador estático e quase aposentado, seria cortado do UFC. Luta entre o jovem e fantástico e o antigo e previsível. Quando a vitória parece clara, a questão é como ela vai acontecer. Lyoto mostrou para Anderson Silva o que deveria ter feito contra Maia se achava-se tão superior.

Quando Lyoto está calmo vê os adversários quadro a quadro. Cada pequena brecha vira rombo e despejou talento num nível que não vemos sempre nem nesse esporte que é tão apaixonante. Quem acha que o chute que colocou um ponto final na carreira de Couture é simples, talvez tenha assistido karate kid demais quando criança. Um chute desses passar raspando, acertar com o dedão, contundir mas não derrubar e todas as variações mais prováveis são o que vemos em tantas tentativas dentro dos octagons. Youtube é testemunha, mas contra um lutador tão experiente, que já tinha começado a esquiva para o lado, estava com a cabeça alta e a uma distância aparentemente segura, só sendo gênio. Em MMA presenciamos performance dos maiores atletas do planeta em vários aspectos e Lyoto mostrou a diferença entre faixa preta e mestre. Em um dos mais bonitos e violentos golpes do esporte Machida renasceu nesse UFC 129.

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